Arroz
Zoneamento agroclimático
Autores
Silvando Carlos da Silva - Embrapa Arroz e Feijão
Silvio Steinmetz - Embrapa Clima Temperado
Alexandre Bryan Heinemann - Embrapa Arroz e Feijão
Na agricultura globalizada, os incrementos nos rendimentos e a redução dos custos e dos riscos de insucessos passaram a ser exigências básicas à competitividade. Maior eficiência no uso de recursos, melhoria qualitativa dos produtos e preservação dos recursos naturais são desafios da sustentabilidade da agricultura moderna. Entretanto, a maioria das culturas está sujeita à imprevisibilidade das variáveis climáticas, para que pouco se tem a oferecer como solução ao produtor sem que haja aumento do custo de produção. Diante desse cenário, o zoneamento agroclimático visa atender a uma grande demanda existente e possibilita redução significativa de perdas na agricultura brasileira por meio de indicação de áreas e períodos de semear mais apropriados à cultura do arroz.
A variabilidade climática sempre foi a principal fonte de risco à atividade agrícola. A elevada taxa de sinistralidade na agricultura brasileira, na maioria devido a causas de adversidade climática, atesta esse fato. Então, foi nesse ambiente que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) adotou o zoneamento agrícola de risco climático Zarc – definição de períodos de semeio – como política agrícola e solicitou à Embrapa que colaborasse no desenvolvimento de estudos que apoiassem tecnicamente essa decisão. Assim, os estudos foram realizados integrando modelos de simulação de crescimento e de desenvolvimento de culturas, bases de dados de clima e de solo, assim como ferramentas de geoprocessamento. Esse trabalho permitiu a geração de uma série de produtos sobre zoneamento de riscos climáticos, ocorreu em definição dos períodos de semear mais apropriados ao cultivo do arroz no Brasil. A utilização dessa técnica, possibilitou a redução dos riscos ambientais para as culturas, o retorno de capitais aplicados em operações de crédito agrícola, a redução das taxas de sinistralidade e, de modo geral, a diminuição do número de indenizações pagas pelo Proagro e por operações privado.
Os processos hidrológicos são aleatórios, ou seja, não é possível saber que a evolução terá os valores de precipitação pluvial ao longo do tempo e do espaço. Esse fato, consequentemente, gera dificuldades no planejamento das atividades agrícolas. O uso de séries longas de dados e alta quantidade de pontos possibilitam melhor entendimento sobre a distribuição espacial da precipitação pluvial de uma região.
Caso o estresse hídrico causado durante a fase vegetativa, poderá haver redução na planta, no número de perfilhos e na área foliar; entretanto, a planta pode recuperar-se, se as necessidades hídricas forem supridas em tempo de permitir que a floração não seja suportada. Por outro lado, se o estresse ocorrer durante o período reprodutivo, de nada adiantará suprir as necessidades hídricas nas fases seguintes, pois o efeito é irreversível.
É evidente que, na cultura do arroz de terras altas, a diminuição de água concorre para a redução na produtividade de grãos da cultura. Para diminuir os efeitos negativos decorrentes da redução hídrica, torna-se necessário semear em períodos nos quais a fase de florescimento – enchimento de grãos – coincide com maior demanda pluvial. O estudo sobre o balanço hídrico do solo possibilita caracterizar os períodos de maior e menor quantidade de chuva e benefícios para a concretização de um zoneamento de risco climático, não qual são as áreas definidas e os períodos mais apropriados ao cultivo do arroz de terras.
Essa tecnologia possibilita viabilizar soluções para um agronegócio competitivo, na medida em que seu foco é reduzir os riscos climáticos e orientar o crédito e o seguro agrícola na tomada de decisões referentes ao calendário de plantio.
Arroz de terras altas
O Zarc é um estudo que visa definir áreas e períodos de semeadura mais apropriados para a cultura do arroz de terras altas, considerando dados climáticos, solos e fases fenológicas de cultivo. Para a realização deste trabalho foram utilizadas técnicas agrometeorológicas e de geoprocessamento. Para tanto, utilizou-se um modelo de balanço hídrico da cultura, que considera a precipitação pluvial, a temperatura do ar, o solo, o coeficiente de cultivo e as fases fenológicas da planta. Duas fases fenológicas do arroz de terras altas foram consideradas para a definição deste trabalho: estabelecimento da cultura e enchimento de grãos. Encontra-se na Figura 1 um exemplo dessa tecnologia.
Figura 1. Espacialização do risco climático para o arroz de terras altas, considerando-se uma cultivar de 100 dias de ciclo, e probabilidade de risco de 20%, 30% e 40%. |
Ressalta-se que por se tratar de uma avaliação de riscos exclusivamente agroclimáticos, parte-se do pressuposto de que todas as demais necessidades da cultura serão atendidas por um adequado manejo agronômico, de forma que não ocorrerão limitações de fertilidade do solo ou danos às plantas devido a pragas, doenças ou plantas daninhas.
A base de dados meteorológicos utilizadas no ZARC é composta por séries históricas obtidas a partir das redes de estações terrestres, meteorológicas e pluviométricas, convencionais e automáticas, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), do sistema HidroWeb, operado pela Agência Nacional de Águas, e aquelas pertencentes ao Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC/INPE), além de redes estaduais mantidas por instituições ou empresas públicas.
As séries de chuva reunidas e com períodos de dados a partir de 1980 passaram por teste de homogeneidade e análise de consistência contempla cerca de 3.500 séries de dados distribuídas em todo o território nacional.
Os dados de temperatura máxima, mínima e média utilizados são os da base gerada por interpolação a partir de 735 estações meteorológicas, conforme descrito por Xavier et al. (2016).
O modelo para cálculo do balanço hídrico utilizado no ZARC é o SARRA (Systeme d'Analyse Regionale des Risques Agroclimatiques), descrito por Baron et al. (1996). Este modelo é usado para se obter as necessidades hídricas e o Índice de Satisfação da Necessidade de Água para a cultura (ISNA), que é definido como a relação entre a evapotranspiração real da cultura (ETr) e evapotranspiração máxima ou potencial da cultura (ETc). A avaliação da disponibilidade hídrica, como um fator de risco, levou em consideração as seguintes variáveis de entrada e resultados:
a) Precipitação pluviométrica
Foram utilizadas séries de dados de chuva preferencialmente com 30 anos de dados. Somente em regiões com escassez de séries de dados de longa duração foram consideradas séries com um mínimo de 15 anos de dados diários, chegando a um total de 3.500 séries pluviométricas aproveitáveis;
b) Evapotranspiração de referência (ETo)
A ETo foi utilizada através de médias decendiais calculadas pelo método de Hargreaves e Samani, (1985) previamente adaptado e recalibrado para as condições brasileiras (Monteiro et al., 2017);
c) Coeficiente de cultura (Kc)
As curvas de Kc, conforme modelo conceitual FAO - 56 (Allen et al., 1998), foram geradas para valores decendiais (Tabela 1) por meio de um modelo bilogístico ajustado a partir de valores de Kc iniciais, máximo e final, determinados em condições experimentais.
Tabela 1. Coeficientes de cultura (Kc) ao longo do ciclo da cultura do arroz de terras altas. |
O Kc é utilizado para a determinação da Evapotranspiração Máxima da Cultura (ETc) decendial.
Essa tecnologia mostra, climaticamente, como minimiza os efeitos negativos decorrentes das irregularidades na distribuição pluvial. Com isso, entenda-se que é possível viabilizar soluções tecnológicas para um agronegócio competitivo, uma vez que seu foco é reduzir os riscos climáticos e orientar o crédito e o seguro agrícola para tomada de decisões referentes ao calendário de plantio.
Os resultados completos de períodos de semeadura podem ser acessados:
1) No painel de indicadores:
http://indicadores.agricultura.gov.br/zarc/
2) Nas Portarias de Zarc por Estado em:
3) No aplicativo Zarc Plantio Certo (Android e IOS)
Arroz irrigado no estado do Rio Grande do Sul
Para o sistema de cultivo de arroz irrigado por inundação, pode ser usado o trabalho Períodos de semeadura para o arroz irrigado no Rio Grande do Sul com base na produtividade de fluxos e em níveis de risco climático, que dá origem às portarias do Zarc publicadas no Diário Oficial da União.
Os períodos de semear para todos os municípios aptos ao cultivo do arroz irrigado foram determinados utilizando-se a metodologia descrita a seguir.
Para determinar os períodos de semeadura com menor risco climático, foi utilizada a versão 1.1 do modelo SimulArroz (www.ufsm.br/simularroz) e uma base de dados climáticos diários denominada Power/Nasa, de um período de 30 anos (1986-2015). Os dados climáticos utilizados pelo SimulArroz são as temperaturas máxima e mínima do ar e a radiação solar.
Foram feitas simulações para quatro grupos de cultivares: grupo 1: Muito precoce (MP) – até 105 dias para a maturidade; grupo 2: Precoce (P) – afeição entre 106 e 120 dias; grupo 3: Médio (M) – alcançado entre 121 e 135 dias; e grupo 4: Tardio (T) – alcançado entre 136 e 150 dias.
Para as estimativas dos riscos climáticos, foram utilizados os valores de produtividade ou rendimento de grãos, estimativas pelo modelo. Os dados de rendimento foram normalizados para cada grupo de cultivar, considerando-se os valores de Rendimento Relativo (RRel), dados pela relação entre o rendimento obtido para cada uma das simulações (diferentes locais, anos e dados de semear) e o Rendimento de Referência (RRef) – equivalente aos valores de alto rendimento para as condições atuais. Os rendimentos de referência considerados foram iguais ao percentil 80 (considerando-se todos os locais e anos), para as cultivares dos grupos 1 e 2, e ao percentil 90, para as cultivares dos grupos 3 e 4. Os anos com sucesso foram considerados quando os valores de RRel foram maiores ou iguais a 60% em relação aos rendimentos de referência (RRef). Os níveis de risco, frequência dos anos em que o RRel foi maior ou igual a 60% do RRef, foram utilizados para a classificação municipal, sendo classificados para os níveis de risco de 20% (80% sucesso), de 30% (70% de sucesso) e de 40% (60% de sucesso).
Os períodos de semear mais frequentes, por decêndios, em três níveis de clima climático estão indicados na Tabela 2.
Tabela 2. Períodos de semeadura mais frequentes, por decêndios, para quatro grupos de cultivares de arroz irrigado e três níveis de clima climático. |
Fonte: Steinmetz et al. (2018). |
Exemplos dos períodos de semeadura, na forma de mapas, para o risco de 20%, para cultivares dos grupos 2 (Precoce) e 3 (Médio) estão indicados, respectivamente, nas Figuras 2 e 3.
Figura 2. Períodos de semeadura para o risco de 20% e cultivares do grupo 2 (Precoce) de arroz irrigado nos distintos municípios e regiões arrozeiras do Rio Grande do Sul. |
Figura 3. Períodos de semeadura para o risco de 20% e cultivares do grupo 3 (Médio) de arroz irrigado nos distintos municípios e regiões arrozeiras do Rio Grande do Sul. |