Métodos de irrigação

Conteúdo atualizado em: 20/09/2023

Autores

Luís Fernando Stone - Embrapa Arroz e Feijão

Pedro Marques da Silveira - Embrapa Arroz e Feijão

José Aloísio Alves Moreira - In memoriam

 

A irrigação da cultura do arroz pode ser feita pelos seguintes métodos: inundação, subirrigação e aspersão. No Brasil, o método mais usado é o de irrigação por inundação contínua. Geralmente, no sistema de tabuleiros em contorno (Figura 1), a inundação é com circulação da água, enquanto, no sistema de tabuleiros retangulares (Figura 2), a lâmina de água é estática. A subirrigação, método de irrigação no qual a água é aplicada diretamente sob a superfície do solo por meio da elevação do lençol freático, tem sido usada em terras baixas drenadas, mas não sistematizadas. Mais recentemente, vem sendo usada a irrigação por aspersão, via pivô central ou sistema linear, tanto no cultivo do arroz em terras altas, de maneira suplementar para suprimir a deficiência hídrica causada pela inadequada distribuição da precipitação pluvial, como em terras baixas, para economizar água. A quantidade de água necessária para o cultivo do arroz varia de acordo com o método de irrigação e depende, principalmente, das condições climáticas, dos atributos do solo, do ciclo da cultivar, da profundidade do lençol freático e do manejo do solo, da cultura e da água. 

Ilustração: Gilson Dias Oliveira  
Figura 1. Tabuleiros em contorno.

 

Ilustração: Gilson Dias Oliveira  
Figura 2. Tabuleiros retangulares.

 

Métodos de irrigação

 

Inundação

A irrigação por inundação consiste, basicamente, em colocar uma lâmina de água em compartimentos formados no terreno, denominados de tabuleiros ou quadros, que são limitados por pequenos diques ou taipas (Figura 3). Os tabuleiros apresentam formas e tamanhos variados.

Os retangulares são formados por diques retilíneos, com o terreno sistematizado, de modo que apresente uma pequena declividade uniforme. Os tabuleiros em contorno são formados por um sistema de diques em curva de nível e diques retilíneos no sentido transversal, para dividir a área no tamanho apropriado.

Foto: Lauro Pereira da Mota
 Figura 3. Irrigação por inundação.

 

 A inundação do solo pode ser feita de maneira contínua, durante grande parte do ciclo do arroz, ou de maneira intermitente, caso em que a lâmina de água é reposta após um intervalo de tempo desde o seu desaparecimento do tabuleiro. A inundação contínua apresenta as seguintes vantagens:

• Diminuição do crescimento das plantas daninhas.

• Controle da temperatura do solo, pois devido à presença de água, que tem calor específico superior ao do solo, não haverá temperaturas extremas.

• Aumento da disponibilidade dos nutrientes para a planta, tais como fósforo, ferro, manganês, potássio, cálcio, magnésio e silício, durante as primeiras semanas de inundação.

• Elevação do pH de solos ácidos a valores próximos à neutralidade.

• Economia de mão de obra.

• Aumento da fotossíntese nas folhas mais baixas, devido ao reflexo da luz na água.


A inundação contínua pode ser feita com lâmina de água estática ou corrente.

A água parada continuamente, apesar da estagnação, normalmente não é prejudicial às plantas de arroz. Entretanto, no sistema mix de pré-germinado, que consiste no uso de sementes pré-germinadas em área com vegetação dessecada e previamente inundada, a decomposição anaeróbica da palha presente na área pode provocar a formação de substâncias tóxicas, particularmente ácidos orgânicos, que afetam o estabelecimento das plântulas.

A eficiência da irrigação com água corrente é menor que a da irrigação com lâmina de água estática, se a água não for convenientemente utilizada. Existe o perigo de os nutrientes do solo serem carregados pela corrente de água. Não há diferença na evapotranspiração (soma da evaporação com a transpiração das plantas) e na percolação (movimento vertical da água no solo além da zona radicular) entre esses sistemas. A irrigação com água corrente é praticada em solos que contêm substâncias tóxicas, devido à pouca percolação ou má drenagem, o que torna necessário um suprimento de água contínuo e corrente. Nos trópicos, a água corrente resulta na diminuição da temperatura do solo, o que pode ser considerado um benefício. A melhor justificativa para utilizar a irrigação com água corrente é a economia de mão de obra, pois, com lâmina de água estática, as práticas de manejo da irrigação são um tanto trabalhosas, especialmente quando não há facilidade de acesso aos pontos de entrada da água.

No Brasil, a maioria das lavouras irrigadas está localizada no estado do Rio Grande do Sul, onde há predomínio do uso de tabuleiros em contorno, que requerem menor sistematização do solo. Geralmente, é feito apenas um aplainamento para eliminar as irregularidades excessivas do terreno. Nesse sistema de irrigação, a água é colocada no tabuleiro mais elevado. Após ter sua lâmina de água estabelecida, a água passa ao tabuleiro imediatamente inferior, e assim por diante, até o último, onde, então, a água excedente escoa para um dreno. Assim, tem-se um sistema contínuo de entrada e saída de água, o que caracteriza a irrigação com água corrente. Em outras partes do País, onde se usam tabuleiros retangulares, com entrada e saída individuais da água, é mais utilizada a inundação com lâmina de água estática.

A inundação intermitente é praticada, principalmente, em áreas com suprimento limitado de água. Pode ser também uma boa opção para áreas servidas por bombeamento, mas não deve ser implantada sem um prévio estudo econômico. Ocasionalmente, a sua adoção pode se fazer necessária para remover compostos tóxicos resultantes do metabolismo microbiano, como ácidos orgânicos, ou íons, como o Fe2+, resultantes do processo de redução que ocorre em solos alagados, que podem atingir níveis tóxicos para as plantas de arroz.

Produções satisfatórias de arroz são obtidas sob inundação intermitente, quando a umidade do solo é mantida perto da saturação, durante o período sem lâmina de água. Entretanto, no Brasil, esse método foi pouco adotado pelos seguintes motivos:

• Requer completo sistema de irrigação e drenagem, envolvendo altos custos.

• Requer práticas de manejo de água mais acuradas e, portanto, mão de obra especializada.

• Requer controle mais eficiente de plantas daninhas, pois algumas dessas plantas crescem mais facilmente sob esse método de irrigação.

Nos últimos anos, porém, a crescente preocupação com a racionalização do uso da água tem incrementado o uso da inundação intermitente, tanto no RS como nas planícies irrigadas tropicais. Nesta última região, é comum a manutenção do solo na condição de saturação durante grande parte do ciclo da cultura, o que minimiza os efeitos do estresse por alta temperatura da água.

A principal contribuição da inundação intermitente para o uso econômico da água está associada ao melhor aproveitamento da precipitação e à diminuição das perdas por escoamento superficial e por percolação (movimento vertical da água no solo além da zona radicular), que são maiores em lavouras inundadas. Um fator importante a ser considerado na irrigação intermitente é o conhecimento das fases de desenvolvimento da cultura em relação à tolerância da planta à falta de água ou daqueles períodos em que o suprimento de água é uma necessidade absoluta.

A ausência da lâmina de água na fase reprodutiva aumenta o número de grãos chochos e, no período de maturação, pode afetar a massa dos grãos. Por sua vez, a retirada da água durante o período de perfilhamento pode trazer vantagens à produtividade, estimulando o sistema radicular a se aprofundar, o que reduz o acamamento, pois o colmo fica com mais resistência e com menor crescimento, melhorando o perfilhamento. A inundação intermitente pode melhorar a qualidade do arroz, por reduzir a acumulação de arsênio nos grãos, assim como a emissão de metano (CH4), diminuindo, assim, o potencial de aquecimento global do cultivo.

Subirrigação

A subirrigação pela elevação do nível do lençol freático vem sendo usada no Brasil, em terras baixas não sistematizadas, onde o lençol freático encontra-se a pequena profundidade do solo. O solo, normalmente, permanece saturado durante grande parte do ciclo da cultura. Nesse método, embora o requerimento de água seja menor que no de inundação contínua, as plantas daninhas são um grande problema. A necessidade de mão de obra também é menor. A subirrigação pode minimizar os problemas de toxicidade de ferro, pois a absorção desse elemento pelas plantas é menor com saturação do que com inundação contínua. A produtividade do arroz obtida com saturação do solo geralmente é menor que a obtida com inundação contínua.

Aspersão

O método de irrigação por aspersão compreende diferentes sistemas, como o convencional, o autopropelido, o pivô central e o sistema linear. O sistema de aspersão convencional é considerado o sistema básico de irrigação por aspersão, do qual derivaram todos os demais. São classificados em portáteis, semiportáteis e fixos, dependendo do grau de movimentação em campo. São usados para irrigação de pequenas áreas. O sistema autopropelido é movimentado por energia hidráulica e possui um aspersor do tipo canhão montado em uma plataforma e uma mangueira de alta pressão de até 500 m. É usado em áreas irrigadas de tamanho médio. O sistema pivô central é um sistema de movimentação circular, movido a energia elétrica ou diesel. Possui uma linha lateral de aspersores suspensa por torres dotadas de rodas. As torres se movimentam independentemente por possuírem motores individuais. Irriga áreas de até 200 ha. O sistema de irrigação linear, também conhecido como lateral móvel, pode ser definido como um sistema de irrigação por aspersão automatizado, no qual um sistema de caminhamento permite mobilidade de todo o equipamento em um sentido transversal sobre a cultura que se deseja irrigar. Possui uma estrutura aérea, composta por lances, que são estruturas de aço compostas por tubos com pequenas saídas em que são colocados os aspersores e por onde é conduzida a água. Os lances são sustentados por um sistema de treliças e tirantes e apoiados sobre torres móveis. A alimentação do sistema é feita por canal ou por mangueira.  É empregado em áreas irrigadas de grande tamanho.


Recentemente, esse método de irrigação via pivô central e, eventualmente, via lateral móvel, vem sendo praticado em algumas lavouras de arroz irrigado da fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul. Com o uso da aspersão via pivô central é possível obter economia de mais de 50% no uso da água em comparação ao sistema tradicional de irrigação por inundação. Além disso, é possível também viabilizar a rotação de culturas.


No cultivo de arroz de terras altas, grande parte das lavouras está localizada na região do Cerrado, onde, durante a estação chuvosa (outubro-abril), quando é feito o seu cultivo, a distribuição das chuvas é irregular, sendo comum, nas áreas classificadas como de médio a alto risco climático, a ocorrência de estiagens de 2 a 3 semanas. Nessa região, predominam Latossolos com baixa disponibilidade de água. Essa característica dos solos, aliada à alta demanda evapotranspirativa, faz com que as estiagens causem consideráveis decréscimos na produtividade do arroz. Uma das alternativas para solucionar esse problema é a irrigação suplementar, normalmente via pivô central (Figura 4) e, eventualmente, via lateral móvel.

 

Foto: Sebastião Araújo
Figura 4. Arroz irrigado por aspersão. 

 

A irrigação por aspersão é indicada para solos de alta permeabilidade e de baixa disponibilidade de água, como a maioria dos solos da região do Cerrado. Esses solos requerem irrigações frequentes, com menor quantidade de água por aplicação, o que é mais fácil de ser conseguido com irrigação por aspersão do que por superfície.

 

Vantagens da irrigação na cultura do arroz

A irrigação, além de propiciar maiores produtividades, melhora a qualidade do produto. Os períodos de deficiência hídrica que a planta de arroz, em condições de sequeiro, sofre durante o ciclo geram qualidade de grão inferior em comparação com o arroz irrigado. A porcentagem de grãos chochos e gessados aumenta consideravelmente quando a deficiência hídrica ocorre durante as fases de emissão da panícula e enchimento dos grãos. Com o uso de irrigação por aspersão o processo de enchimento dos grãos não sofre descontinuidade. Consequentemente, o número de grãos por panícula e a massa dos grãos são maiores e o número de grãos chochos é menor.

Além do aumento na produtividade e na qualidade do arroz, é possível utilizar o equipamento de irrigação para outras culturas na safra de outono-inverno, o que promove, assim, maior uso do equipamento, e propicia maior rentabilidade ao agricultor.