Manejo de plantas daninhas

Conteúdo migrado na íntegra em: 29/09/2021

Autor

Mábio Chrisley Lacerda - Embrapa Arroz e Feijão

 

Por muito tempo, não se deu importância ao controle de plantas daninhas em arroz de terras altas por ser esse cultivado quase sempre em áreas de abertura, ainda livres dessas, situação em que nenhuma medida de controle é necessária. Em consequência disso, há carência de produtos e tecnologia para o controle de plantas daninhas em arroz em terras velhas, problema que, somado à baixa capacidade de competição do arroz, constitui um dos principais obstáculos para a introdução da cultura em sistemas agrícolas permanentes.

O controle de plantas daninhas consiste na adoção de práticas que resultam na redução da infestação, mas não necessariamente na sua completa eliminação e tem como objetivos evitar perdas de produção devido à competição, beneficiar as condições de colheita e evitar o aumento de suas infestações. A associação de métodos de controle deve ser utilizada sempre que possível, porém é conveniente que a estratégia de controle, melhor método, no momento oportuno, esteja adaptada às condições locais de infraestrutura, disponibilidade de mão de obra, implementos e análise de custos. Entre os métodos de controle, destacam-se os controles cultural, preventivo, mecânico e químico.
 
Com o advento das cultivares modernas, o arroz passou a ser cultivado em rotação com a soja e, em áreas com irrigação suplementar, no pivô central. Essas áreas apresentam grande diversidade de infestação de plantas daninhas. O controle químico passou a ser uma prática muito utilizada por apresentar menor custo e maior eficiência, quando comparado aos demais métodos.
 
Como a maioria das cultivares modernas apresentar baixa taxa de crescimento inicial e porte menor que em relação às cultivares tradicionais, uma boa cobertura do solo pelas plantas só ocorre de 40 a 50 dias após a semeadura. Para diminuir ao máximo a interferência das plantas daninhas na produtividade do arroz, a cultura deverá permanecer no “limpo” entre 15 e 45 dias após a emergência.
 

Para alcançar eficiência no controle das plantas daninhas, é apropriada a aplicação associada de dois ou mais herbicidas com características diferentes, para controlar um grande número de espécies e manter a cultura limpa por um longo período. Dessa forma, a aplicação sequencial de um herbicida em pré e outro em pós-emergência, ou aplicações associadas de dois pós-emergentes com diferentes espectros de ação resultam em controle final mais eficiente.

 

Principais espécies de plantas daninhas

Entre as plantas daninhas que ocorrem com maior frequência na cultura do arroz de terras altas, destacam-se as espécies do gênero Brachiaria: o capim-braquiária (Brachiaria decumbens) (Figura 1) e a Brachiaria plantaginea (Figura 2).

 

Fotos: Kissmann, K. G.
Figura 1. Capim-brachiária (Brachiaria decumbens). Figura 2. Capim-braquiária (Brachiaria plantaginea).

 

O gênero Cenchrus é constituído por 23 espécies, sendo a Cenchrus echinatus (Figura 3), timbete, a mais importante. Das espécies do gênero Digitaria, destacam-se Digitaria horinzontalis (Figura 4), Digitaria insularis (Figura 5) e Digitaria sanguinalis (Figura 6), popularmente chamadas de milhã ou capim-colchão. A diferenciação dessas espécies no campo é bastante difícil. As espécies do gênero Commelina e Ipomoea, além de serem altamente competitivas, dificultam a colheita e conferem altos teores de umidade ao grão.

Fotos: Kissmann, K. G.
Figura 3. Timbete (Cenchrus echinatus). Figura 4. Digitaria horizontalis.

 

Fotos: Kissmann, K. G.
Figura 5. Digitaria insularis. Figura 6. Digitaria sanguinalis.

 

Estratégias de controle químico

Seletividade

O primeiro passo para o controle químico de plantas daninhas é o conhecimento da seletividade dos herbicidas no arroz. A produtividade final do arroz é definida pelo balanço dos seus componentes: número de panículas por área, número de grãos por panícula e massa de 100 grãos. A aplicação do herbicida é realizada a partir da semeadura até 30 dias após a emergência das plântulas, e é justamente nessa época que o arroz determina o número de perfilhos por área, os quais são chamados de “caixa de produção” do arroz, ou seja, determinam o potencial de produção da lavoura. Se houver danos no arroz devido à aplicação de herbicida, o número de perfilhos pode ser diminuído e reduzirá o potencial de produção.

A seletividade dos herbicidas ao arroz ocorre pelas seguintes razões:

  • nas aplicações em pré-emergência, a seletividade se deve à posição do herbicida com relação à semente de arroz no solo;
  • nas aplicações em pós-emergência, a seletividade é principalmente de natureza fisiológica, por meio de mecanismos de degradação que evitam danos às plantas.

    
O pendimethalin e o trifluralin são do grupo das dinitroanilinas, que não possuem seletividade metabólica para a cultura do arroz. Devido à baixa solubilidade em água e à alta capacidade de adsorção nos coloides do solo, os produtos permanecem até 2 cm de profundidade, e a seletividade ocorre pela localização da semente. Esse é um dos motivos para se recomendar a semeadura de 3 cm a 5 cm de profundidade. Se ocorrer semeadura rasa, alta precipitação pluvial, acima de 75 mm, ou dose alta em solo arenoso, e as plântulas de arroz entrarem em contato com o herbicida, o desenvolvimento radicular será afetado e, com isso, aparecerão sintomas de amarelecimento das plantas e raízes curtas e grossas.

 
Para o clomazone, herbicida que inibe a síntese em cultivares susceptíveis, o sintoma é o branqueamento das folhas. A variabilidade genética da tolerância ao herbicida é nítida e a cultivar BRS Primavera é a mais sensível ao produto. Alguns safeners (protetores) têm promovido menor toxicidade às cultivares sensíveis. A seletividade do arroz ao metsulfuron-metil depende da cultivar e do estádio da planta na época da aplicação. A pulverização aos 10 dias após a emergência (DAE) diminui em 17% a produtividade de grãos da cultivar BRS Primavera em relação à testemunha.
 

O perfilhamento das gramíneas, em geral, está diretamente ligado à relação dos hormônios citocinina/auxina na planta. Quanto menor a relação, maior a dominância apical e menor o perfilhamento. O herbicida 2,4-D é uma auxina e sua aplicação aumenta a concentração do hormônio na planta, incrementa a dominância apical e, consequentemente, diminui o perfilhamento quando é aplicado no estádio de perfilhamento do arroz, por isso recomenda-se sua aplicação após esse período.

Aplicações precoces, de 10 a 20 DAE, de graminicidas pós-emergentes também podem causar diminuição do perfilhamento do arroz.

 

Controle de plantas daninhas de folhas estreitas

As opções de controle (Figura 7) são as seguintes:

 Ilustração: Marcos Aurélio Gonçalves
Figura 7. Estratégia para controle de plantas daninhas de folhas estreitas.

 

  • Pré-emergência: fundamental em áreas que, pelo histórico de utilização em anos anteriores, sabe-se que são infestadas.
     
  • Aplicação sequencial em pré-emergência e, após 30 dias, aplicação de pós-emergência. Essa modalidade é necessária para áreas que possuem infestação acentuada de braquiária e timbete. Há necessidade de reduzir as doses em pré-emergência e pós-emergência.
  • Aplicação somente em pós-emergência: indicada para áreas que não possuem histórico de infestações expressivas e que ocorrem durante a condução da cultura.
  • Aplicação sequencial em pós-emergência, a primeira aos 10 DAE e a segunda aos 30 DAE. Essa modalidade torna-se necessária quando não se aplicam herbicidas em pré-emergência e, com isso, observa-se uma alta infestação inicial, que não pode ser controlada apenas com uma aplicação em pós-emergência. A pulverização inicial deve ser executada com doses menores do que as indicadas, ou com safeners, para evitar toxicidade à cultura, que também está em estádio inicial. Essa modalidade de aplicação justifica-se, também, pois os herbicidas de pré-emergência, no caso do plantio direto, geralmente não conseguem ultrapassar a cobertura morta e não atingem o alvo.
  • Aplicação precoce aos 10 DAE de produto de pré-emergência, adicionado a um outro de pós-emergência. Essa modalidade é utilizada quando, por opção ou por desconhecimento, deixou-se de aplicar os herbicidas de pré-emergência e, logo após a emergência da cultura, verifica-se a ocorrência de alta infestação de plantas daninhas. Com a mistura dos dois herbicidas, o de pós-emergência controla as plantas daninhas existentes e o de pré-emergência possibilita um maior período de controle.


A melhor alternativa dependerá dos seguintes fatores: custo dos herbicidas, preço do arroz, população e tipo das plantas daninhas e sistema de plantio.


Controle de plantas daninhas de folhas largas

As plantas daninhas mais prejudiciais à cultura do arroz de terras altas são as de folhas estreitas. Entretanto, podem ocorrer situações de infestações por plantas com folhas largas que necessitam ser controladas. Nesse caso, as aplicações são feitas em pós-emergência, apesar de alguns herbicidas aplicados em pré-emergência, visando ao controle de plantas daninhas de folhas estreitas, possuírem ação sobre algumas folhas largas. Para isso, são utilizados os herbicidas metsulfuron-metil (Ally) e 2,4-D, os quais são aplicados em épocas diferentes. 

O metsulfuron-metil apresenta melhor eficiência de controle quando aplicado no estádio inicial das plantas daninhas, ou seja, com duas a quatro folhas, como o amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla), a trapoeraba (Commelina virginica), a corda-de-viola (Ipomoea acuminata) e, principalmente, a erva-de-touro (Tridax procumbens). Assim, ele pode ser pulverizado no período de 15 dias após a emergência do arroz até os estádios indicados das plantas daninhas, com adição de 0,2% v/v de óleo mineral. É menos exigente que o 2,4-D com relação aos estádios da cultura na época da aplicação e depende da cultivar.

O 2,4-D, por suas características de seletividade com relação ao arroz de terras altas e por ter melhor eficiência em plantas daninhas mais desenvolvidas que o metsulfuron-metil, é indicado também para aplicações mais tardias. Normalmente é utilizado em infestações em que o metsulfuron-metil só controla as plantas daninhas nos estádios iniciais, como, por exemplo, a erva-de-touro.
 
Do ponto de vista prático, a cultura do arroz deve ficar livre da interferência de plantas daninhas a partir de 15 dias após a emergência. Em áreas altamente infestadas, onde a emergência das plantas daninhas pode ocorrer junto com a do arroz, é imperativo que o controle seja feito antes dos 35 DAE, o que inviabiliza a aplicação de 2,4-D.

 

Controle de infestações mistas


Há situações de infestação mista, com plantas daninhas de folhas estreitas e de folhas largas, que necessita ser controlada em pós-emergência. As pulverizações, entretanto, devem ser separadas por uns 7 dias, já que o latifolicida, se misturado ao graminicida, prejudica sua ação. Nesse caso, o primeiro produto a ser aplicado é aquele que controla as plantas daninhas que apresentam infestação mais intensa, respeitando os princípios de seletividade.


Principais herbicidas registrados

 
Na Tabela 1, encontram-se os herbicidas registrados para o manejo de áreas no sistema de plantio direto e/ou cultivo mínimo, bem como os seletivos para a cultura do arroz.
 
Tabela 1. Herbicidas recomendados(1) para o controle de plantas daninhas em lavouras de arroz de terras altas.

(1)A eventual ausência de algum herbicida não implica a sua não recomendação, desde que registrado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).
(2) As informações constantes nesta tabela estão de acordo com os registros do Agrofrt <http:/''extranet.agricultura.gov.br/agroftt_cons/principal_agrofit_cons>;2. Doses menores para solos arenosos e maiores para solos argilosos; 3. Doses menores para solos arenosos e maiores para solos argilosos no sistema de plantio convencional; 4. Doses menores para solos arenosos e maiores para solos argilosos no sistema de plantio direto.
Fonte: Agrofit (http://extranet.agricultura.gov.br/agrofit_cons/principal_agrofit_cons)

 

 

Referência

KISSMANN, K. G. Plantas infestantes e nocivas. 2. ed. São Paulo:BASF, 1997. 825 p.