Manejo do solo e sistema de plantio

Conteúdo migrado na íntegra em: 05/10/2021

Autores

José Alberto Petrini - Embrapa Clima Temperado

Ariano Martins de Magalhães Junior - Embrapa Clima Temperado

Giovani Theisen - Embrapa Clima Temperado

Algenor da Silva Gomes - In memoriam

 

As áreas próprias para cultivo do arroz irrigado caracterizam-se pela topografia plana e de difícil drenagem, onde os solos permanecem saturados em períodos de maior precipitação pluvial. A drenagem deficiente está relacionada não apenas à topografia plana, mas também à ocorrência de horizontes subsuperficiais argilosos, com baixa condutividade hidráulica, e à proximidade do lençol freático da superfície do solo. Isso favorece a manutenção de lâmina de água sobre a superfície do solo e dificulta a lixiviação de nutrientes. Para o aproveitamento eficiente e racional das áreas de arroz irrigado, antes de seu cultivo, há necessidade de submetê-las a um processo de sistematização, que inclui a abertura de canais de irrigação e de drenagem, a construção de estradas internas, o nivelamento da superfície do solo, em nível ou desnível, e entaipamento. Conforme a necessidade de cada projeto, pode haver necessidade de estruturas complementares, como pontes e bueiros. Portanto, a sistematização da área consiste em um conjunto de práticas e não apenas no nivelamento da área.

O arroz irrigado na região subtropical do Brasil é cultivado em cinco sistemas de plantio: sistema convencional (SC), cultivo mínimo (CM), plantio direto (PD), pré-germinado (PG) e transplante de mudas (TM). Nos sistemas de cultivo mínimo, convencional e de plantio direto, o arroz é semeado em solo seco. Por sua vez, no sistema pré-germinado e no transplante de mudas, a semeadura se dá em solo submerso. O preparo do solo para cada sistema de cultivo apresenta características próprias e a área varia entre os anos agrícolas em razão de características microrregionais, do clima e da própria dinâmica da rotação de culturas nas áreas orizícolas. No estado do Rio Grande do Sul, a área de arroz irrigado no período entre 2015 a 2020 foi próxima a 1 milhão de hectares, com um predomínio do cultivo mínimo (60% a 65% da área), seguido dos sistemas convencional (25%), pré-germinado (15%) e plantio direto, este último inferior a 3%. O sistema de transplante de mudas é pouco usado no Sul do Brasil e está restrito a áreas de produção de sementes de arroz irrigado. Em Santa Catarina, no mesmo período, foram cultivados em torno de 146 mil hectares de arroz irrigado. O sistema pré-germinado, que no início da década predominava em mais de 95% da área de arroz daquele estado, reduziu para cerca de 75% e lentamente está sendo substituído pelo cultivo em solo seco, principalmente pelo lançamento de cultivares resistentes a herbicidas do grupo das imidazolinonas (CL), que tornam possível o controle de arroz-vermelho nas áreas cultivadas.

Em qualquer método de cultivo, é necessário manejar adequadamente a área no período pós-colheita de arroz irrigado. O manejo do solo deve ser feito, de preferência, o mais rápido possível após a colheita do arroz para permitir o uso das áreas com pastagens ou plantas de cobertura no inverno e possibilitar semear a próxima cultura de verão no período recomendado. Nesse sentido, as operações mais importantes são as seguintes: o desmanche das taipas, a correção dos rastros causados pelas colhedoras e pelo transporte de grãos, o manejo da palha do arroz e o nivelamento da superfície do solo. Um detalhamento dos principais sistemas de cultivo do arroz irrigado, no Sul do Brasil, é apresentado a seguir.

 

Sistema convencional (SC)

No sistema convencional de cultivo do arroz irrigado, o manejo dado ao preparo do solo envolve três etapas: preparo primário e secundário do solo; semeadura do arroz a lanço ou em linhas; e formação da lâmina de água sobre a superfície do solo. O estabelecimento da lâmina de água ocorre a partir de 15 dias após a emergência das plântulas de cultivares de ciclo superprecoce e precoce e em torno de 25 dias em cultivares de ciclo médio e tardio. É recomendado o preparo da área com antecedência, para permitir que a lavoura seja semeada na época mais adequada, sem atrasos na semeadura.  

Quando o preparo é realizado em condições de solo muito seco, há necessidade de maior número de operações e isso aumenta o seu custo. Por sua vez, em condições de excesso de umidade, as operações não são eficientes, além da possibilidade de causarem danos à estrutura do solo.

De modo geral, a primeira ação consiste no desmanche das taipas da safra anterior, normalmente realizado com a própria entaipadora, ou, na ausência dessa, com grades, arados e/ou lâminas. A seguir, é realizado o preparo primário que consiste em operações que visam corrigir os rastos das colhedoras e manejar e enterrar a palha do arroz. É um preparo pesado, normalmente feito com grade aradora que opera em profundidade de 40 cm no perfil do solo, sendo também empregados os arados de disco ou de aiveca.

O preparo secundário do solo pode ser definido como o conjunto das operações superficiais subsequentes ao preparo primário, que visam à realização das seguintes operações: destorroamento, nivelamento do terreno, incorporação de herbicidas e fertilizantes (se for o caso) e eliminação de plantas daninhas no início de seu desenvolvimento. Visam também facilitar a semeadura do arroz, criar um ambiente favorável ao desenvolvimento inicial das plântulas e nivelar a área para que a lâmina da água de irrigação seja uniforme. Em geral, as grades de discos e as de dentes, juntamente com as plainas, são os implementos mais empregados nesse preparo. Outro implemento que pode ser utilizado no preparo do solo para o cultivo do arroz irrigado é a enxada rotativa, que realiza, em uma só operação, as duas etapas de preparo: lavração e gradagem.

A semeadura pode ser realizada a lanço, com espalhadores ou semeadoras-adubadoras, conjugadas ou não, ou em linha, com semeadora-adubadora apropriada que distribui as sementes de 2 cm a 5 cm de profundidade, geralmente com espaçamento de 17 cm entre linhas. Nesse sistema de plantio, alguns produtores utilizam rolo compactador após a semeadura para aumentar o contato das sementes com o solo e uniformizar a emergência das plântulas de arroz.

Nas semeaduras precoces, o solo pode apresentar baixa temperatura e isso pode atrasar a germinação e a emergência do arroz. Nesse caso, recomenda-se ajustar criteriosamente a profundidade de deposição das sementes no solo, de preferência não ultrapassar 2 cm de profundidade.

 

Sistemas de plantio direto (PD) e cultivo mínimo (CM)

A adoção do cultivo mínimo e do plantio direto na cultura do arroz irrigado, na região subtropical do Brasil, teve como objetivos o controle do arroz-vermelho, a melhoria da capacidade produtiva do solo e a redução de custos na implantação da lavoura. Nesses sistemas de cultivo, o preparo do solo não ocorre imediatamente antes da semeadura do arroz, como no sistema convencional. As operações são realizadas com bastante antecedência (cerca de 4 a até 9 meses antes da semeadura do arroz) ou até mesmo nem são realizadas. Além disso, esse sistema de cultivo propicia melhoria na qualidade física e química dos solos e o favorecimento à diversificação de culturas.

No cultivo mínimo, o preparo do solo compreende as seguintes operações: aração, gradagem, aplainamento, entaipamento e valeteamento. Esses procedimentos são semelhantes aos realizados no SC, mas, em geral, diferem quanto à época de realização. O preparo é feito imediatamente após a colheita da cultura do verão anterior, de modo que, no inverno, a área já esteja pronta, nivelada e entaipada, para o cultivo do arroz irrigado, e coberta com pastagem ou outras plantas de cobertura de solo.

Na primavera, a área é dessecada e o arroz da nova safra semeado com semeadora de plantio direto. Já para utilizar o que se denomina sistema de plantio direto em arroz, a dinâmica é um pouco diferente: na rotação arroz-arroz, o sistema pode ser usado quando a colheita ocorre em solo seco, no qual o preparo do solo na pós-colheita pode ser dispensado, pois as colhedoras não danificam o solo nessa condição. A próxima safra de arroz pode ser implantada com semeadora de plantio direto, após a dessecação da vegetação hibernal. Entretanto, a colheita do arroz em solo submerso favorece a qualidade de grãos e facilita a operação de colheita (quando há água livre na superfície do solo e menos barro fica aderido à máquina e há menor índice de patinagem, em comparação à colheita em um solo somente saturado ou encharcado). Como as áreas planas são difíceis de ser drenadas por completo, os produtores optam por manter a água nos quadros pelo maior tempo possível. Com isso, a operação de colheita gera rastros profundos no solo, sendo necessário preparar a área para os próximos cultivos. Essa é uma das razões pelos quais a área de plantio direto em arroz irrigado tem se mantido numa proporção bastante baixa no Sul do Brasil.

Quando o arroz irrigado é cultivado em rotação e após o cultivo de milho, sorgo ou soja, o preparo do solo geralmente é dispensado após a colheita dessas culturas, pois é realizado em solo seco. Nesse caso, o produtor limita-se ao valeteamento das áreas (para mantê-las drenadas durante o inverno) e remontar as taipas com antecedência, para o cultivo do arroz no próximo verão. Dessa forma, o plantio direto utilizado em áreas de terras baixas se assemelha bastante àquele praticado nas terras altas.

O preparo antecipado do solo é reconhecido como um dos principais elementos que contribuem para o alcance de altas produtividades em arroz irrigado no RS. Esse preparo possibilita semear o arroz na época mais adequada para o máximo aproveitamento da radiação solar na fase de enchimento de grãos, o que também otimiza o aproveitamento dos nutrientes (maior resposta à adubação) e maximiza a produtividade da água usada na irrigação. Além disso, a antecipação do preparo propicia a germinação de sementes de plantas daninhas num período em que não concorrem com a cultura do arroz. Há redução do banco de sementes no solo e minimiza a pressão das plantas daninhas no próximo cultivo.

Nas variantes mais utilizadas no arroz irrigado, PD, com preparo de solo no verão, e CM, com preparo do solo na primavera, ocorre revolvimento reduzido do solo antes da semeadura da cultura. Do mesmo modo, a rotação de culturas é uma prática que vem sendo incrementada nos solos de várzea. Na atualidade, a utilização dos sistemas PD e CM, além de minimizar a infestação de arroz-vermelho, proporciona outros benefícios à orizicultura, como a diversificação de culturas.

No PD em que há sucessão arroz-arroz, o preparo do solo é realizado nos meses de janeiro a março (preparo de verão) e, normalmente, compreende uma aração, duas gradagens e aplainamento. Não existe a necessidade de desmanchar por completo os torrões, pois, como a semeadura do arroz é realizada após alguns meses, essa tarefa é completada pelas chuvas de inverno.

No CM, as operações de preparo do solo são semelhantes às realizadas no PD, diferindo apenas quanto à época de realização, visto que essas ocorrem no final do inverno ou início da primavera, de 60 a 45 dias antes da semeadura. O preparo do solo antecipado, tanto no CM, como no PD, visa corrigir pequenas imperfeições do microrelevo, preparar a superfície do solo para receber as sementes de arroz e, principalmente, estimular a emergência de plantas daninhas, como o arroz-vermelho e o arroz-preto, num período em que essas não concorram com a cultura do arroz.

Após o preparo do solo, é melhor que se faça o entaipamento prévio com taipas de perfil suave e base larga (± 2,8 m de largura) e com menor altura (0,2 a 0,4 m, dependendo da declividade do terreno) do que utilizar as taipas convencionais (Figuras 1 e 2). Esse procedimento não prejudica as demais práticas culturais, pois as taipas, se bem construídas, suportam o trânsito de máquinas e implementos. Além disso, as semeadoras  possuem rodado articulado que permite semeaduras uniformes também sobre as taipas.

  Foto: Algenor da Silva Gomes
Figura 1. Perfis de taipas tradicional e com base larga e suave para semeadura. Figura 2. Entaipadora de base larga (moderna). 

 

No PD e no CM é aconselhável a implantação de uma forrageira de inverno, sendo o azevém (Lolium multiflorum L.) a mais utilizada (Figura 3). Outras espécies, como aveia preta (Avena strigosa Schreb), trevo-persa (Trifolium resupinatum L. ), trevo branco (Trifolium repens L.), lótus El Rincón (Lotus subbiflorus Lag.) e nabo forrageiro (Raphanus sativus L.) apresentam bom desempenho desde que as áreas sejam bem drenadas. Quando não houver interesse ou possibilidade de uma exploração mais intensiva da área com pecuária ou com coberturas no inverno, a cobertura vegetal será composta pelas plantas que se estabelecerem naturalmente após o preparo do solo (flora de sucessão). 

Foto: Algenor da Silva Gomes
Figura 3. Azevém em solo de arroz irrigado, com sistema de drenagem superficial implantado. 

Na cobertura formada pela flora de sucessão que se estabelece após o preparo do solo em áreas com alta infestação de plantas daninhas, predomina, geralmente, o arroz-daninho e o capim-arroz. Quando essas espécies germinam no outono, geralmente dá-se pouca importância, pois estão fora da época de competição com o arroz. Entretanto, as plantas desses fluxos tardios de germinação rapidamente produzem sementes, que ficam dormentes no inverno, mas que certamente ocasionarão problemas no próximo cultivo de verão. Para minimizar essa condição, pode-se utilizar a área com pecuária, controlar mecanicamente essas plantas com gradagem leve, dessecar a área antes de essas plantas daninhas produzirem sementes (dessecação outonal) ou semear uma pastagem cedo no outono, para reduzir a produção de sementes das plantas daninhas tardias. Para o cultivo do arroz irrigado, tanto no CM quanto no PD, 2 t a 3 t de matéria seca na superfície do solo são suficientes para que se tenha uma adequada cobertura para a semeadura da cultura. Quantidades maiores, além de dificultarem a evaporação da água do solo, podem produzir ácidos orgânicos em níveis tóxicos à germinação e à emergência do arroz.

Na dessecação da cobertura vegetal, são empregados herbicidas sistêmicos de ação total. Por não serem seletivos, atuam em plantas anuais ou perenes. Como praticamente não possuem efeito residual no solo, possibilitam a semeadura imediata do arroz na área tratada. Para que haja uma absorção suficiente dos produtos, a relação entre parte aérea e sistema radicular das plantas deve ser de pelo menos 1:1; ou seja, deve haver uma superfície relativamente alta de parte aérea para absorver a calda de aplicação e garantir a eficiência da dessecação. Os dessecantes mais utilizados no CM e no PD são o glifosato, o glufosinato de amônio e o 2,4-D. No caso do glifosato, produto mais utilizado para plantas anuais, são utilizadas doses entre 2 L/ha a 4 L/ha, enquanto para plantas perenes deve-se usar uma dose maior, entre 4 L/ha e 6 L/ ha.

Essas variações de doses estão relacionadas, principalmente, às espécies de plantas presentes na área, às condições nas quais essas se encontram e ao teor de umidade do solo. A experiência adquirida pelos orizicultores com a adoção dos sistemas PD e CM vem possibilitando a redução das doses de herbicidas empregadas no manejo da cobertura, em decorrência, principalmente, no caso do PD, da associação desses com o final do ciclo da espécie utilizada ou com o manejo mecânico.

Nas épocas em que as áreas não são cultivadas com arroz irrigado, é importante que o solo seja drenado. Isso irá favorecer a produção de biomassa das pastagens e/ou de coberturas hibernais, acelerar a degradação de alguns herbicidas e reduzir seu efeito prejudicial em longo prazo, reduzir a emissão de gases de efeito estufa, favorecer a qualidade do solo e facilitar as ações que requerem mecanização, que normalmente se iniciam próximo da semeadura. O sistema de drenagem mais comum é o valeteamento, formado por uma série de drenos superficiais estreitos, de 8 cm a 12 cm, feitos por valetadeiras (Figura 4), que conduzem a água para drenos secundários maiores, os quais são ligados aos drenos principais.

Em razão de suas dimensões em largura, os drenos secundários não dificultam o trânsito de máquinas, podendo ser construídos próximo uns dos outros, quando necessário. Uma drenagem deficiente favorece a presença das gramas-boiadeiras, as quais, depois de estabelecidas, são de difícil controle na lavoura arrozeira. A locação dos drenos e a eficiência de drenagem podem ser otimizadas utilizando-se tecnologias como o mapeamento tridimensional das áreas. Nesse caso, o planejamento dos drenos é feito em computador, e sua confecção no campo realizada por tratores e equipamentos guiados por GPS de alta precisão. Técnicas modernas de sistematização em desnível também podem ser empregadas, sendo aplicadas tanto para uniformizar a drenagem quanto para otimizar a irrigação do arroz.

Foto: Algenor da Silva Gomes

Figura 4. Valetadeira usada na construção de drenos superficiais em áreas cultivadas com arroz irrigado.

 

A irrigação do arroz nos sistemas PD e CM assemelha-se àquela utilizada no sistema convencional de cultivo. Todavia, alguns produtores antecipam a época de início do alagamento do solo, com o intuito de utilizar a água como uma barreira física para o controle de plantas daninhas.

A adubação da cultura do arroz irrigado, nos sistemas PD e CM, de modo geral, seguem as mesmas recomendações utilizadas para o sistema convencional. Recomenda-se que sempre se utilizem os fertilizantes de acordo com o que é indicado na análise do solo, ou também na análise foliar, para o caso de aplicações mais tardias de nutrientes na cultura. As cultivares de arroz apresentam respostas diferenciadas (baixa, média ou alta) em relação às adubações utilizadas, aspecto que também deve ser levado em conta ao planejar o manejo da cultura. Maiores detalhes sobre adubação do arroz irrigado são encontrados no item Correção do Solo e Adubação. Todavia, no PD, quando for cultivado após pastagem de inverno, a adubação do arroz deve ser realizada visando suprir suas necessidades, de modo que o arroz se beneficiaria do efeito residual, principalmente no que se refere ao fósforo e ao potássio.

O estabelecimento de uma população adequada de plantas é importante para a obtenção de altos rendimentos. Na realidade, as plantas de arroz, notadamente as cultivares do tipo moderno, apresentam alta capacidade de perfilhamento, podendo compensar um menor número de plantas por área, por meio da emissão de um maior número de afilhos. Por sua vez, uma alta população de plantas não garante altos rendimentos, pois, nessa condição, embora o número de panículas possa ser maior, essas são constituídas por um número menor de espiguetas, com menor massa de grãos.

De modo geral, para os três sistemas mencionados, a densidade de semeadura deve viabilizar uma população de 200 a 250 plântulas de arroz por metro quadrado para cultivares convencionais, e de 100 a 150 plantas por metro quadrado no caso do arroz híbrido.

Dessa forma, é importante conhecer a massa de mil sementes da cultivar a ser utilizada. Também deve-se levar em consideração a quantidade de sementes a ser utilizada e as variáveis que influenciam a germinação das sementes, tais como: clima, principalmente temperatura, solo, cobertura vegetal e cultivar. Assim, é aconselhável seguir as orientações dos detentores das cultivares utilizadas. Para esses sistemas, recomenda-se o espaçamento de 17 cm entre linhas. 

 

Preparo do solo na pós-colheita do arroz irrigado utilizando o rolo-facas

A redução no consumo de energia é um grande desafio na produção de arroz irrigado. Uma alta demanda de energia é requerida pelas operações de preparo do solo, pela necessidade de a colheita do arroz ser realizada em solo molhado.

Difícil de evitar, o preparo pós-colheita é necessário para a semeadura da próxima cultura, sendo geralmente feito com arados, grades e plainas (AGP), em operações que, além de exigentes em energia, causam intenso revolvimento do solo e podem ser demoradas. O preparo AGP requer solo seco, porém o outono-inverno é geralmente chuvoso no Sul do Brasil, o que pode retardar o estabelecimento das culturas. Em alguns anos, o preparo é atrasado a tal ponto que sequer a safra do verão seguinte é semeada no tempo adequado. Nesse sentido, um método de preparo menos dependente das condições climáticas e menos demandante em energia pode favorecer os sistemas de cultivo nas terras baixas.

Os equipamentos baseados em rolagem, como o rolo-faca, têm sido usados na agricultura em várias regiões do mundo. Esse equipamento requer menos força de tração e menos energia em comparação à aração e gradagem. Quando usado no preparo do solo na pós-colheita do arroz irrigado, o uso do rolo-faca requer água livre na superfície do solo para expressar sua melhor eficiência (Figura 5). Esse aspecto, entretanto, implica o uso do equipamento imediatamente após a colheita do arroz ou mesmo em períodos de chuva, o que lhe confere vantagem temporal e operacional em relação ao preparo convencional. O rolo-faca é um tambor de aço oco com comprimento variável e cerca de 1 m de diâmetro, com lâminas externas de tamanho entre 10 cm a 15 cm altura, preenchido com água, conforme a massa desejada. O rolo é passado em alta velocidade (entre 6 km e 12 km por hora) na área de arroz recém-colhida, tracionado com trator, e pela sua massa e força inercial, consegue corrigir as imperfeições do terreno, desmanchar as taipas e incorporar parcialmente a palha do arroz ao solo (Figuras 5A, 5B e 5C). De modo geral, quando a água livre é uniforme na área, uma ou duas passadas (cruzadas, de preferência) são suficientes para ajustar o solo deixando-o apto para o estabelecimento de pastagens ou mesmo para a implantação da próxima cultura de verão. Recomenda-se drenar a área somente após 3 dias da operação com o rolo-faca, para evitar a perda de nutrientes e de solo pela água.

Em experimentos conduzidos pela Embrapa, o preparo do solo pós-arroz irrigado, utilizando rolo-faca com duas passadas cruzadas, e o método convencional com aração e gradagens, constatou-se que o rolo foi mais eficiente em termos energéticos e operacionais (tempo) e entregou a área apta ao cultivo no verão seguinte (Figura 5C). Na média de 3 anos de avaliações em uma rotação arroz-soja, o balanço energético final, que indica a energia representada nos grãos colhidos após se descontar toda a energia utilizada na produção, foi 9% maior no preparo do solo com o rolo-faca. O retorno energético por energia investida, que representa a energia líquida produzida por cada unidade de energia alocada ao sistema, melhorou 22% quando o método do rolo-faca foi utilizado. O consumo de diesel para o preparo do solo usando o rolo-faca foi de 45 L/ha, enquanto o método convencional consumiu 94 L/ha. Quanto à eficiência operacional no quesito tempo, o preparo do solo com o rolo-faca reduziu o período de trabalho em 29%, ou seja, de 10,1 horas para 7,2 horas por hectare. A velocidade relativamente alta com que esse equipamento é utilizado (7 km por hora, no caso) e o número reduzido de passadas necessárias (somente duas vezes) são responsáveis por essa diferença.

Fotos: Giovani Theisen
Figura 5. Rolo-facas sendo passado após a colheita do arroz irrigado, com água livre na superfície do solo (A, B); aspecto da área finalizada 3 dias após a operação (C). 

 

Sistema de cultivo pré-germinado

Define-se o sistema pré-germinado (PG) como um conjunto de técnicas de cultivo de arroz irrigado adotado em áreas sistematizadas, onde as sementes, previamente germinadas, são lançadas em quadros nivelados e inundados.

Este sistema é, atualmente, uma alternativa viável para áreas que apresentam problemas de produtividade, principalmente pela alta infestação de arroz-vermelho. Em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, o sistema PG ocupava, até bem pouco tempo, 95% e 10% da área total cultivada com arroz irrigado, porém seu uso tem sido reduzido.

O sistema PG apresenta as seguintes vantagens: controle mais eficiente do arroz-daninho (arroz-vermelho e arroz-preto), menor dependência do clima para o preparo do solo e a semeadura, menor consumo de água para irrigação e planejamento mais efetivo das atividades da lavoura.

No Rio Grande do Sul, identificam-se algumas dificuldades para a adoção e expansão do sistema PG: produtores de médio e grande porte (em áreas maiores, o manejo é dificultado); a mão de obra carece de maior capacitação; maior custo inicial para a implantação da lavoura pelo processo de sistematização do solo; em determinadas regiões, ocorre ataque de aves e moluscos no período de emergência; ocorrência de plantas daninhas resistentes à maioria dos herbicidas recomendados para esse sistema; falta de domínio no manejo da água e falta de cultivares mais bem adaptadas ao sistema.

As operações das áreas consistem no nivelamento do solo com adequação dos sistemas de irrigação, drenagem e viário, as quais são importantes requisitos para o sistema. Adotam-se quadros fixos com tamanho e forma adequados, regulares e em geral de pequenas dimensões (1 ha a 2 ha), separados por taipas permanentes e com irrigação e drenagem independentes. Em algumas situações de topografia, é viável utilizar as áreas entre taipas em curvas de nível. Requisitos importantes para a implantação do sistema devem ser levados em consideração: pré-germinação da semente, controle efetivo da irrigação e drenagem, uso de equipamentos adequados e utilização de semente isenta de arroz-daninho.

No manejo do sistema PG tradicionalmente adotado no RS, recomenda-se sistematizar em nível (cota zero) ou próximo de zero (0,02%), o que facilita a drenagem para a colheita do arroz e para o caso de estabelecer-se um plano de rotação de culturas na área, sendo a soja um exemplo crescente de uso da área de cultivo.

 

Preparo tradicional do solo no sistema pré-germinado

Tradicionalmente, o preparo do solo é realizado com água, para formação de lama (Figura 6) e para nivelamento (Figura 7) e alisamento do solo (Figura 8). A primeira fase do preparo do solo visa trabalhar a camada superficial para a formação de lama em solo já inundado. Essa atividade envolve a operação com grade aradora em solo úmido, seguida de destorroamento sob inundação com enxada rotativa. A segunda fase compreende o renivelamento e o alisamento do terreno, utilizando-se pranchões de madeira com o objetivo de deixar a superfície lisa e nivelada, própria para receber a semente pré-germinada (Figura 9). Essas práticas proporcionam maior consumo de água e desgaste de máquinas e equipamentos, o que exige manutenções regulares; bem como favorece a ocorrência de acamamento de plantas e arraste de frações importantes do solo (coloides minerais e orgânicos) para fora da lavoura, proporcionando o seu empobrecimento e o assoreamento de corpos de água.

Para minimizar esses problemas, há necessidade de desenvolver práticas alternativas e conservacionistas, como o preparo do solo no seco e a semeadura do arroz PG sobre lâmina de água permanente (sem drenagem).

Foto: José Tomelim
Figura 6. Formação de lama para sistematização do solo. 

 

Foto: José Tomelim
Figura 7. Sistematização e nivelamento do solo com água. 

 

Foto: José Tomelim
Figura 8. Operação com pranchão alisador para acabamento do solo.

 

Foto: José Tomelim
Figura 9. Área com lâmina de água (5 cm a 7 cm) para procedimento da semeadura.
 

 

Preparo alternativo do solo no sistema pré-germinado

No RS, adota-se o preparo do terreno em solo seco (Figuras 10 e 11) com manejo da água alternativo, que proporciona maior rentabilidade e qualidade ambiental sem comprometimento na obtenção de alta produtividade. Nesse manejo, após o período de 20 a 30 dias de lâmina de água (10 cm), realiza-se a semeadura sem drenagem da água, ou seja, a lâmina de água (7 cm) é mantida até próximo à colheita, apenas repondo-a quando necessário (Figuras 12 e 13). 

Foto: José M. Parfitt
Figura 10. Receptor de raios laser montado em plaina na execução da sistematização.

 

Foto: José A. Petrini
Figura 11. Solo seco após o procedimento da sistematização e pronto para inundação com lâmina de água permanente (10 cm).

 

Foto: José A. Petrini
Figura 12. Área com arroz na fase de emergência após semeadura em lâmina de água permanente (5 cm a 7 cm)

 

Foto: José A. Petrini
Figura 13. Lavoura estabelecida no sistema pré-germinado com a semeadura efetuada sobre lâmina de água permanente (5 cm a 7 cm). 

 

Considerações importantes para o sistema pré-germinado

a) Não existem genótipos no RS desenvolvidos e ou devidamente adaptados ao manejo do sistema PG. A cultivar BRS 705 tem apresentado ótimos resultados de produtividade e adaptação para esse sistema, pois apresenta ótima resistência ao acamamento; no entanto, as cultivares de SC são selecionadas para esse sistema.

b) Para a pré-germinação das sementes, realiza-se a imersão dessas (25 kg a 30 kg) em água por 24 horas, acondicionadas em embalagens de polipropileno trançado. Após a hidratação, as sementes são colocadas à sombra por 24 a 36 horas, dependendo da temperatura do ar (incubação). As sementes devem ser umedecidas sempre que necessário. O coleóptilo e a radícula deverão atingir de 2 mm a 3 mm para o momento adequado da semeadura.

c) A escolha da cultivar para semeadura deve basear-se em características consideradas essenciais: ciclo, qualidade da semente, adaptação ao manejo do sistema, resistência à brusone, resistência à toxidez por ferro e resistência ao acamamento. Em áreas infestadas pelo arroz-vermelho, existe a possibilidade do uso de cultivares CL.

d) Como parâmetro geral, recomendam-se 120 kg/ha de sementes viáveis (corrigir a % de germinação para 100) para semeaduras até final de outubro e 100 kg/ha para semeaduras a partir de novembro. Para cultivares pouco afilhadoras, recomenda-se cerca de 170 kg/ha.

e) A semeadura deve ser realizada em solo com lâmina de água de 5 cm a 7,0 cm. É recomendável que ela seja feita no período do dia em que o vento seja mínimo e que a água dos quadros esteja limpa. No RS, em razão do tamanho da lavoura, essa operação pode ser feita manualmente por meio de semeadoras a lanço e aviões agrícolas.

f) Em áreas infestadas de arroz-daninho, recomenda-se, após o preparo do solo, deixar uma lâmina de água (10 cm) durante 20 a 30 dias antes da semeadura. No sistema tradicional de manejo da água, em que o preparo do solo é feito com lâmina de água, é recomendável a drenagem da área de 1 a 3 dias após a semeadura, tendo o cuidado de não deixar água acumulada, pois isso favorece possíveis danos causados por moluscos, insetos aquáticos e aves. O solo deve permanecer sempre saturado ou encharcado para favorecer o desenvolvimento das plantas. A medida que as plântulas forem se desenvolvendo, deve-se retornar gradativamente a lâmina de água, mantendo-a em torno de 7 cm até próximo da colheita.

g) No controle de plantas daninhas nesse sistema, deve-se dar especial atenção às plantas aquáticas. Recomenda-se que, durante o período de ação dos herbicidas, a água de irrigação permaneça estagnada (sem retirada da área), o que proporciona vantagens ao meio ambiente.