Manejo do solo e sistema de plantio

Conteúdo migrado na íntegra em: 04/10/2021

Autor

Alberto Baeta dos Santos - Embrapa Arroz e Feijão

 

O arroz irrigado é cultivado em áreas que apresentam topografia plana e de difícil drenagem e, em períodos de maior precipitação pluvial, os solos permanecem saturados. Nesses solos, há presença de horizontes subsuperficiais argilosos, com baixa condutividade hidráulica, que, aliados à topografia plana e à proximidade do lençol freático da superfície do solo, propiciam drenagem deficiente. Essa condição possibilita manter lâmina de água na superfície do solo e reduzir a lixiviação de nutrientes.

Antes de as áreas de arroz serem cultivadas, há necessidade de submetê-las a sistematização do terreno, que consiste na adequação da superfície do solo, de forma a permitir melhor manejo da água, tanto de drenagem como de irrigação, para o seu aproveitamento eficiente e racional. Com isso, uma série de benefícios diretos e indiretos ocorrem, como, por exemplo, economia no uso da água, semeadura na época preferencial, melhor eficiência de insumos e maior produtividade de grãos de arroz e das culturas em sucessão.

Na região tropical, o arroz irrigado é cultivado na época de maior ocorrência de chuvas. Nessa região, a permeabilidade do solo, o clima e a diversidade de atributos das bacias hidrográficas, particularmente pela alteração sazonal do nível freático, dificultam a adoção do manejo da irrigação com lâmina contínua, sem intervalos de oxidação. Na entressafra do arroz, a presença de um período seco, com a possibilidade de manejo da água dos canais e do lençol freático por subirrigação, viabiliza o cultivo de espécies, como soja, melancia, milho e outras.

As formas de plantar arroz se agrupam em dois grandes sistemas: semeadura direta e transplante. Basicamente, esses sistemas diferenciam-se quanto aos seguintes aspectos: forma e época de preparo do solo, métodos de semeadura e manejo inicial da água. Na semeadura direta, como o nome indica, as sementes são distribuídas diretamente no solo, quer na forma de sementes secas em solo seco distribuídas em linhas quer na forma de sementes pré-germinadas, a lanço, em solo inundado. No sistema de transplante de mudas, antes de serem levadas para o local definitivo, as plântulas são produzidas primeiramente em viveiros ou sementeiras. Independentemente do método de preparo do solo, é necessário fazer o aplainamento da superfície da área, para corrigir as irregularidades do terreno. Essa prática, além de permitir a uniformização da lâmina de água e o controle mais eficiente das plantas daninhas, também favorece o sistema de plantio.

Em qualquer sistema de cultivo, é necessário manejar adequadamente a área no período pós-colheita de arroz irrigado. O manejo do solo deve ser feito, de preferência, o mais rápido possível após a colheita do arroz. Isso permite o cultivo de espécies de sequeiro, como a soja, em sucessão, por meio de irrigação subsuperficial, durante o vazio sanitário, conforme o sistema agrícola predominante nas várzeas, no estado do Tocantins. As operações mais importantes nesse sentido são a correção dos rastros na superfície do solo provocados pelo tráfego das colhedoras e dos equipamentos de transporte de grãos e o manejo dos resíduos de colheita.

Na região tropical, o arroz irrigado é cultivado no sistema de semeadura em solo preparado, denominado sistema convencional, e em solo não revolvido, em plantio direto ou cultivo mínimo. É cultivado também, em áreas restritas, nos sistemas pré-germinado e transplante de mudas, em solo submerso.

Sistema de semeadura em solo preparado

Este é o sistema predominante de plantio de arroz irrigado, em especial nas várzeas tropicais, como no estado do Tocantins. Nesse sistema, o manejo eficiente das plantas daninhas é essencial, pois a inundação permanente somente é realizada cerca de 3 semanas após a emergência das plântulas de arroz.

O preparo do solo envolve os preparos primário e secundário, mediante o uso de um ou mais implementos, a fim de propiciar condições satisfatórias para a semeadura, a germinação das sementes, a emergência das plântulas, o desenvolvimento e a produção das plantas. O preparo primário consiste em operações mais profundas, com o uso de grades aradoras para romper as camadas compactadas e proceder à incorporação da cobertura vegetal. O preparo secundário compreende um conjunto de operações superficiais subsequentes ao preparo primário. São realizadas com grades destorroadoras e niveladoras ou plainas para destorroar, nivelar, incorporar agroquímicos e eliminar plantas daninhas no início de seu desenvolvimento. Outro implemento que pode ser utilizado no preparo do solo para o cultivo do arroz irrigado é a enxada rotativa, que realiza em uma só operação, as duas etapas de preparo: aração e gradagem. A semeadura é feita em linhas mediante o uso de semeadora-adubadora, com a camada superficial do solo drenada. Com isso, há maior eficiência na utilização dos fertilizantes, visto que são colocados somente no sulco de semeadura, abaixo das sementes. Visam facilitar a semeadura do arroz, criar um ambiente favorável ao desenvolvimento inicial das plântulas e nivelar a área para que a lâmina da água de irrigação seja uniforme. O espaçamento entre linhas ao redor de 17 cm a 20 cm e uma população de 50 plântulas por metro de linha de plantio são considerados os mais adequados, o que corresponde a um gasto de 80 kg/ha a 120 kg/ha de sementes. A população de plantas influencia a incidência e a severidade da brusone. Todas as medidas para aumentar a população de plantas favorecem o rápido desenvolvimento da doença nas folhas. Nesse sistema, é recomendável a utilização de rolo compactador após a semeadura, operação denominada de rolagem, para aumentar o contato das sementes com o solo, obter maior porcentagem de germinação e uniformidade de emergência de plântulas de arroz.

Sistemas plantio direto e cultivo mínimo

Nestes sistemas de plantio, a semeadura é efetuada diretamente no solo com preparo reduzido ou sem revolvimento, contendo resíduos do cultivo anterior, antecedida ou seguida da aplicação de herbicida de ação total para controle das plantas daninhas e voluntárias. Dessa forma, a incidência de plantas daninhas é bastante reduzida. Na semeadura, somente é aberto um pequeno sulco com profundidade e largura suficientes para garantir boa cobertura e contato da semente com o solo, e não mais de 25% a 30% da superfície do solo são movimentados. Nesses sistemas de plantio, o preparo do solo não ocorre imediatamente antes da semeadura do arroz, como no sistema convencional. As operações são realizadas com bastante antecedência para possibilitar o desenvolvimento de uma cobertura vegetal ou até mesmo nem são realizadas. Em geral, efetua-se preparo reduzido do solo para promover a germinação das sementes de plantas daninhas e voluntárias, bem como, reduzir as irregularidades da superfície do solo. O emprego desses sistemas visa ao controle do arroz-vermelho e à redução de custos na implantação da lavoura. O gasto de sementes é maior que na semeadura em solo preparado, verificando-se maiores respostas com 150 kg/ha de sementes no mesmo espaçamento entre linhas, o que corresponde a 500 sementes por metro quadrado. O sistema de plantio direto possibilita a utilização mais racional da maquinaria, haja vista o seu custo de operações ser 2,5 vezes menor que o da semeadura convencional. Eventualmente, esse sistema pode se tornar inviável em determinadas áreas de várzeas da região tropical, em razão da alta ocorrência de ratos, que proliferam rapidamente. Além disso, seu controle é mais difícil devido à cobertura vegetal constituída pelos resíduos do cultivo anterior e das plantas daninhas.

Preparo do solo e manejo alternativo à queima da palha na pós-colheita do arroz irrigado

Na região tropical, o cultivo de arroz irrigado seguido de espécies de sequeiro, como a soja, na entressafra, requer adequado manejo pós-colheita da área em épocas apropriadas. Em geral, a colheita do arroz irrigado ocorre com o solo alagado ou em condições de umidade de saturação. Com isso, são necessárias operações que possibilitam a correção de rastros deixados pela colhedora na superfície do solo (Figura 1) e o manejo dos resíduos de colheita do arroz.

Foto: Alberto Baêta dos Santos 
Figura 1. Lavoura de arroz após a colheita e rastros da colhedora.

 

A palha de arroz compreende a massa da matéria seca da planta de arroz acima do solo que permanece no campo após a colheita. As cultivares de arroz irrigado atualmente em uso apresentam índice de colheita de grãos de 0,50 a 0,55, ou seja, a quantidade de palha produzida é similar à quantidade de grãos. Com o aumento da produtividade de grãos do arroz irrigado ocorre aumento da produção de palha. A presença de grande quantidade de palha tem propiciado dificuldades operacionais no preparo do solo para implantação de culturas em sucessão. Para o manejo da palha, em vez de queimá-la, recomenda-se sua incorporação no solo, pois isso facilita sua decomposição.

Na região tropical, muitos produtores não utilizam colhedoras equipadas com picador ou espalhador de palha, o que provoca a formação de leiras (Figura 2), as quais facilitam a operação de queima da palha antes do preparo do solo para o cultivo das espécies em sucessão ao arroz irrigado.

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 2. Leiras de palha formadas por colhedoras sem picador.

 

Em várzeas tropicais, a queima da palha de arroz irrigado é uma prática tradicional (Figura 3 e 4). No entanto, isso é considerado prejudicial à matéria orgânica do solo (MOS) e à atmosfera, devido à libertação de CO2 e outros gases. 

 

Fotos: Alberto Baêta dos Santos
Figura 3. Queima da palha de arroz irrigado. Figura 4. Resíduos da colheita de arroz queimados.

 

As operações de preparo para as culturas de entressafra requerem solo seco e alta demanda de energia. Com isso, um método de preparo menos demandante em energia, que possibilite sua realização independentemente das condições climáticas, pode favorecer a implantação das culturas em várzeas tropicais. Atualmente, na produção de arroz irrigado, o grande desafio é a redução do consumo de energia.

A incorporação da palha do arroz irrigado com rolo-faca (Figura 5) requer menos força de tração e menos energia em comparação com o preparo convencional, em que, em geral, são empregadas grades aradoras, grades niveladoras e plainas. O rolo-faca pode ser empregado imediatamente após a colheita do arroz, independentemente de ocorrência de chuvas, propiciando vantagem temporal e operacional em relação ao preparo convencional, que causa intenso revolvimento do solo.

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 5. Manejo do solo e da palha com rolo-faca.

 

A incorporação da palha do arroz irrigado com rolo-faca imediatamente após a colheita, ainda com lâmina de água, propicia a preparação antecipada do solo com economia de tempo, operações e combustível no cultivo da soja em sucessão. Esse manejo do solo e da palha possibilita a semeadura direta da soja (Figura 6), sem revolvimento do solo e/ou associada com grade niveladora.

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 6. Solo com palha de arroz irrigado incorporada com rolo-faca para semeadura direta das culturas de entressafra, sem revolvimento.

 

A queima da palha de arroz pode ser substituída pela sua incorporação com uma passada de rolo-faca e duas de grade niveladora, sem prejudicar a produtividade da sucessão arroz-soja e com redução de operações e possibilidade de efetuar o preparo antecipado do solo. A supressão do uso do fogo no manejo da palha de arroz irrigado em várzeas tropicais promove a sustentabilidade ambiental e de uso do solo.

Sistema pré-germinado

Este sistema de plantio já predominou em diversas regiões representativas de produção de arroz irrigado no Brasil. Contudo, está sendo substituído pelo sistema de semeadura em solo seco, principalmente após o lançamento de cultivares resistentes a herbicidas do grupo das imidazolinonas (CL), que possibilitam o controle de arroz-vermelho das áreas cultivadas.

No sistema pré-germinado, a semeadura do arroz é efetuada manualmente, por meio de semeadoras a lanço hidráulicas acopladas ao trator ou por avião agrícola, sobre uma lâmina rasa de água, cerca de 5 cm a 7 cm, permanente, a qual é mantida ao longo do ciclo da cultura, sem drenagem. O sistema tradicional, em que a submersão do solo ocorre 20 a 30 dias antes da semeadura, exige um grande volume de água por ocasião do preparo do solo e da semeadura. No entanto, a quantidade total de água necessária ao cultivo de arroz irrigado é menor que nos demais sistemas, em virtude da baixa percolação de água no solo, em face da formação da lama. Contudo, esse sistema de plantio pode se tornar inviável para determinadas regiões, como nas várzeas no estado do Tocantins, pois, na época preferencial de semeadura, que vai de outubro a dezembro, o nível do lençol freático e dos rios está baixo e a germinação do arroz depende da ocorrência da precipitação pluvial.

Uma alternativa ao sistema tradicional é efetuar o preparo do solo seco. Nesse caso, a inundação é feita, apenas, por ocasião do nivelamento da área. Isso propicia controle mais efetivo de plantas daninhas, menor uso da água e melhoria da qualidade ambiental, por reduzir a perda de solo e de agroquímicos aplicados à lavoura.

A pré-germinação das sementes consiste em acelerar o processo natural de germinação, na ausência de solo, de tal maneira que, por ocasião da semeadura, a semente já apresente a radícula e o coleóptilo claramente desenvolvidos, não devendo ultrapassar 2 mm a 3 mm de comprimento (Figura 7).

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 7. Sementes pré-germinadas de arroz aptas para a semeadura, com a radícula e o coleóptilo medindo de 2 mm a 3 mm.

 

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 8. Preparo do solo inundado com enxada rotativa.

 

O sistema pré-germinado apresenta as seguintes vantagens: controle mais eficiente de plantas daninhas, em especial o arroz-vermelho menor dependência do clima para o preparo do solo e para a semeadura; e menor consumo de água para irrigação.

Transplante

No Brasil, esse sistema de plantio é usado em pequenas lavouras, especialmente na região Nordeste. Nas demais regiões, seu uso está restrito aos campos de produção de sementes, principalmente nas lavouras onde não há mais disponibilidade de novas áreas e naquelas já cultivadas que se encontram infestadas por arroz-vermelho.

Esse sistema compreende as fases de produção de mudas e de transplante propriamente dito e constitui o método mais eficiente de controle do arroz-vermelho.

É um sistema de semeadura indireta, no qual o arroz é semeado inicialmente em sementeira ou viveiro, em solo bem preparado. Assim que as mudas atingem tamanho adequado para o transplante, são levadas para o campo definitivo. Na produção de sementes de alta qualidade, para se obter pureza varietal, a eliminação de plantas contaminantes, atípicas, também denominada de purificação ou roguing, é prática fundamental e é facilitada quando se emprega o sistema de transplante.

O transplante manual é indicado para áreas menores ou onde se tenha disponibilidade de mão de obra. Para transplantar manualmente 1 ha, é necessário o equivalente ao trabalho diário de 30 a 40 homens. As mudas devem ser transplantadas em áreas previamente drenadas ao atingirem 20 a 30 dias de idade, o que corresponde a uma altura ao redor de 25 cm (Figura 9).

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 9. Transplante manual de mudas de arroz na vazante do Açude de Orós, CE.

 

O transplante mecanizado deve ser feito quando as mudas atingirem em torno de 12 cm de altura, o que se verifica por volta de 18 dias após a semeadura (Figura 10).

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 10. Mudas de arroz com tamanho adequado para o transplante mecânico.

 

No transplante mecânico, as mudas são produzidas em caixas apropriadas de madeira ou plásticas, com fundo perfurado, com 5 cm de altura e comprimento e largura de acordo com a transplantadora a ser usada. Em geral, essas dimensões são de 60 cm de comprimento e 30 cm de largura.

As transplantadoras permitem regulagens de três a dez mudas por cova, espaçamento entre 14 cm e 22 cm entre covas e 30 cm entre linhas. O rendimento médio de uma transplantadora com seis linhas chega a cerca de 3 mil metros quadrados por hora, ou seja, três horas para transplantar 1 ha, sendo necessárias de 120 a 130 caixas de mudas por hectare, com possibilidade de reutilização a cada 20 dias (Figura 11).

Foto: Alberto Baêta dos Santos
Figura 11. Transplante mecanizado de mudas de arroz irrigado.

 

O preparo do solo, o manejo de água, o controle de plantas daninhas, de insetos-praga e de doenças são idênticos aos recomendados para o sistema pré-germinado (Figura 12).

Foto: Sebastião Araújo
Figura 12. Cultivo de arroz irrigado por transplante mecanizado de mudas.