Adubação e nutrição

Conteúdo atualizado em: 18/02/2022

Autor

Juscimar da Silva - Embrapa Hortaliças

 

Os fatores de solo relacionados com a nutrição da pimenteira são de natureza física, mineralógica, química e biológica. Dentre os fatores de natureza física, a estrutura e a textura do solo são as mais relevantes porque se referem ao arranjo espacial das partículas que compõe a fase sólida do solo (estrutura) e a distribuição das partículas de acordo com seu tamanho (textura). Essas duas propriedades do solo estão intimamente relacionadas e a textura, em especial, apresenta conotações tanto quantitativas – expressa a proporção relativa das partículas de areia, silte e argila que compõe a fase sólida do solo – quanto qualitativas, pois se relacionam direta e indiretamente com muitas propriedades físico-químicas do solo, como a capacidade de retenção de fosfato, a capacidade de troca de cátions (CTC), a retenção e a infiltração de água, dentre outras reações do solo.
 
A textura adquire importância, portanto, nas relações solo-água-planta-atmosfera, e interfere na capacidade de infiltração da água, na evaporação e no suprimento de nutrientes.

Partículas mais grosseiras (quartzo e areia), por exemplo, apresentam menor capacidade de retenção de água e reduzida atividade química, mas, por outro lado, facilitam a drenagem e aeração do solo. A fração coloidal (argila) influencia sobremaneira as propriedades do solo por apresentar grande área superficial específica e densidade de carga elevada, conferindo a essa fração alta reatividade química.
 
Os principais fatores químicos que influenciam a dinâmica de nutrientes no solo são a composição mineralógica do solo, a disponibilidade de nutrientes, a presença de elementos tóxicos, o teor de matéria orgânica, as reações de sorção e precipitação e a salinidade. Da mesma forma que a textura e a estrutura, esses fatores atuam de maneira simultânea, interagindo entre si, e, portanto, não devem ser considerados isoladamente. A menor ou maior reserva de nutrientes no solo e a presença de elementos tóxicos para as plantas estão associadas com a composição mineralógica, herdada, na maioria dos casos, do material de origem.
 
Conforme já foi mencionado, os solos de regiões tropicais são antigos e altamente intemperizados, caracterizados pela concentração de óxidos, principalmente de alumínio e de ferro, e pelas perdas de bases por lixiviação, tornando-o empobrecido quimicamente. Esses óxidos juntamente com os argilominerais remanescentes conferem ao solo cargas elétricas superficiais que retêm cátions e ânions. A disponibilidade de nutrientes para as plantas dependerá, portanto, do tipo de ligação formada entre as superfícies carregadas eletricamente e os íons.
 
O pH do solo governa diretamente as reações do solo e, de maneira geral, valores de pH entre 5,5 a 6,5 são favoráveis ao desenvolvimento da pimenteira. Os macronutrientes N, P, K, Ca, Mg e S, por efeitos indiretos ou diretos, têm sua disponibilidade aumentada a valores de pH próximos a neutralidade (pH entre 6,0 – 6,5). Para valores de pH inferiores a 5,5 podem ocorrer danos ao desenvolvimento da cultura face à elevada atividade de elementos potencialmente fitotóxicos, como Al e Mn. O P, macronutriente limitante ao desenvolvimento das plantas na maioria dos solos brasileiros, é muito pouco disponível em condições de pH baixo em razão da retenção do ânion fosfato pelas partículas carregas positivamente na superfície dos óxidos. Esse comportamento é observado também para os ânions sulfato e molibdato. Os micronutrientes, com exceção para o Mo, têm sua disponibilidade aumentada em condições de pH mais ácidos.
 
A matéria orgânica do solo é produzida a partir da decomposição dos resíduos vegetais e animais, sendo formada por compostos de carbono em vários graus de associação com as outras fases do solo. Além de ser fonte de nutriente, a matéria orgânica também apresenta cargas de superfície que contribui para o aumento da CTC do solo e, devido a sua alta reatividade, regula a disponibilidade de vários micronutrientes, bem como a atividade de elementos fitotóxicos como Al3+ e Mn2+ e elementos-traço em solos ácidos.
 
O cuidado com a salinidade do solo deve ser tomado principalmente em regiões onde a água de irrigação apresenta altas concentrações de sais. Os sais em excesso prejudicam o desenvolvimento da pimenteira não só pelos efeitos diretos sobre o potencial osmótico da solução do solo e pelos íons potencialmente tóxicos presentes em levadas concentrações, mas também pela degradação de algumas propriedades físicas dos solos, reduzindo a infiltração da água, as trocas gasosas, o crescimento de raízes e, com isso, dificultando o crescimento da pimenteira. Portanto, deve-se monitorar a condutividade elétrica do solo observando se o valor não está próximo de 4 dS m-1 quando o solo é considerado salino.
O manejo adequado da irrigação, utilizando águas com baixo teor de sais e adubação equilibrada, reduz a ocorrência de acúmulo de sais. A correção do solo salino limita-se à lixiviação dos sais associada a um sistema de drenagem adequado, aplicando uma lâmina adicional de água, além do uso continuado de culturas para promover a retirada destes sais do perfil do solo. Para solos de textura arenosa recomenda-se a lavagem do solo durante dez dias e 100 dias para solos de textura argilosa.
 
Os fatores ligados à planta que também determinam menor ou maior desenvolvimento da pimenteira, produtividade e retorno econômico são inerentes à genética, a espécie, a cultivar, a eficiência de absorção de nutrientes, doenças e pragas, ao manejo, dentre outros. Controlar esses fatores pode levar a seleção de espécies mais adaptadas às condições de acidez de solo, mais tolerantes a elementos fitotóxicos como o Al3+ e Mn2+ e, por fim, mais adaptadas às condições de baixa fertilidade do solo.

ELEMENTOS REQUERIDOS NA NUTRIÇÃO DA PIMENTEIRA
 
Os nutrientes minerais têm por definição funções específicas e essenciais no metabolismo da planta, participando como constituintes de estruturas orgânicas, ativadores enzimáticos ou reguladores osmóticos. Dependendo da exigência de um dado nutriente para o desenvolvimento vegetal, o mesmo pode ser considerado macronutriente ou micronutriente. Dezessete elementos são considerados essenciais para o desenvolvimento da planta: carbono (C), hidrogênio (H), oxigênio (O), nitrogênio (N), fósforo (P), potássio (K), cálcio (Ca), magnésio (Mg), enxofre (S), boro (B), cloro (Cl), cobre (Cu), ferro (Fe), manganês (Mn), molibdênio (Mo), níquel (Ni) e zinco (Zn). Há também os elementos classificados como benéficos para algumas plantas como o sódio (Na), silício (Si), selênio (Se) e cobalto (Co).
O K e, aparentemente, o Cl são os únicos nutrientes que não fazem parte de estruturas orgânicas. Suas funções estão associadas à regulação osmótica (dentro do vacúolo, por exemplo), manutenção do equilíbrio eletroquímico no interior das células e seus compartimentos e regulação de atividades enzimáticas.
A disponibilidade e absorção dos nutrientes devem ocorrer em proporções adequadas, via solução do solo ou como suplementação via foliar, uma vez que cada um tem uma função especifica no metabolismo das plantas. Desequilíbrios em suas proporções podem causar deficiência ou excesso de nutrientes, causando limitações ao crescimento das plantas ou mesmo a morte delas.
 
A menor ou maior mobilidade do elemento no interior da planta ajuda a identificar qual(is) elemento(s) está(ão) limitando o desenvolvimento e a produtividade da cultura. Elementos móveis, como N, P e K, são translocados para as partes superiores da planta onde as estruturas mais jovens estão em desenvolvimento, com isso os sintomas de deficiência desses nutrientes são observados na parte inferior da planta (folhas velhas). Por outro lado, os sintomas de deficiência dos elementos de mobilidade limitada, como Ca e B que estão associados à formação de parede celular, são observados nas folhas mais novas (Figura 1).
 
 Figura: Juscimar da Silva
Fluxograma diagnóstico para identificação de deficiências comuns de nutrientes.
Figura 1. Fluxograma diagnóstico para identificação de deficiências comuns de nutrientes.
 
ADUBAÇÃO

 

Conhecer a fertilidade do solo mediante análise química juntamente com a textura do solo e o potencial de produção da cultivar a ser plantada é fundamental para a definição das quantidades de fertilizantes a serem utilizadas. Da mesma forma, o conhecimento do histórico da área também deve ser considerado, uma vez que os resíduos das adubações anteriores podem atingir níveis de toxidez, em especial para micronutrientes.

A partir dos resultados da análise química do solo, comparam-se os teores disponíveis aos das tabelas regionais de adubação para identificar a Classe de Fertilidade do Solo. Deve-se ter atenção, no entanto, quanto ao método de análise utilizado que altera a interpretação dos níveis de fertilidade do solo. No estado de São Paulo, por exemplo, a resina de troca aniônica é o método adotado para determinar o teor de P disponível no solo, enquanto em Minas Gerais e algumas outras regiões produtoras é utilizado o Mehlich-1.
A partir da definição da classe de fertilidade do solo – muito baixa, baixa, média, alta – recorrem-se as tabelas de recomendação de adubação química de plantio para o cultivo da pimenta.
 
Embora a maioria dos Estados ou regiões produtoras, em especial Minas Gerais, já possua tabelas de recomendação de adubação baseada nos diferentes níveis de nutrientes no solo, conforme pode ser verificado na Tabela 2 para o Distrito Federal, apenas para o estado de São Paulo é que se verifica uma recomendação de adubação especifica para a cultura da pimenta. Assim, para o espaçamento de 1,2 a 1,4 x 0,7 a 0,9 m, recomenda-se aplicar na adubação de plantio 40 kg ha-1 de N, 160 a 600 kg ha-1 de P2O5 e 60 a 180 kg ha-1 de K2O. Adicionalmente, aplicar 1 kg ha-1 de B e 3 kg ha-1 de Zn se o teor disponível de Zn, extraído por DTPA, for inferior a 0,6 mg dm-3. Para a adubação de cobertura aplicar de 80 a 120 kg ha-1 e de 80 a 120 kg ha-1 de K2O.
 
Reafirma-se que as quantidades menores ou maiores dependerão da análise do solo, análise foliar, cultivar, produtividade esperada e sistema de cultivo.
 
É importante enfatizar que o uso de fontes concentradas de nutrientes N, P e K, nas formulações, tem sido apontado como principal responsável pelo aparecimento de sintomas de deficiência de enxofre nos solos. De maneira geral, o teor de S menor que 5,0 mg dm-3 é considerado baixo, portanto, sua correção se faz necessária. A restituição do S exportado pelas culturas pode ser feita pela aplicação de gesso agrícola ou outras fontes com contenha o nutriente, como o sulfato de magnésio. Recomenda-se aplicar no plantio de 10 a 30 kg ha-1 de S.
 
Em razão das dificuldades de realizar, em campo, ensaios de calibração da análise do solo, a interpretação dos resultados dos teores de micronutrientes ainda é muito discordante e necessita de melhor padronização. Cabe ressaltar, entretanto que em alguns estados já existem tabelas de interpretação dos resultados da análise do solo para micronutrientes, definidas por órgãos oficiais (Tabela 3).
 
Por fim, ressalta-se que o manejo adequado da adubação passa também pela identificação da textura do solo em razão da interação dos nutrientes com a fase sólida do solo. Nos solos de textura arenosa ou média, teor de argila menor que 400 g kg-1, e de baixa CTC, a adubação com N e K deve ser parcelada em quatro (4) a seis (6) vezes para evitar perdas por lixiviação.
 
Tabela 2. Níveis de fertilidade do solo e recomendação de adubação para a região do Distrito Federal, baseada na análise química do solo.
Teor disponível do solo Quantidade de adubo
 mg dm-3 kg ha-1
Fósforo (P) Potássio (K) P2O5 K2O
0 - 10 0 - 50 600 - 400 200 - 150
11 - 30 51 - 100 400 - 200 150 - 100
31 - 50 101 - 150 200 - 100 100 - 50
> 50 > 150 50 -
Fonte: Fontes (1987) 
 
Já para os solos de textura mais argilosa, a localização dos nutrientes na linha de plantio ou ao redor da planta, na projeção da copa (Figura 2), é outra prática recomendada, principalmente para os fertilizantes que contém fontes solúveis de P em sua formulação, como o nitrofosfato ou o superfosfato triplo. Esta prática baseia-se no principio do posicionamento do fertilizante próximo ao sistema radicular, favorecendo sua disponibilidade para a cultura, a redução de sua adsorção pelos coloides do solo e favorecimento de seu transporte pelo espaço poroso, em razão do maior gradiente de concentração entre a rizosfera e a região fertilizada. Como já foi mencionado anteriormente, deve-se ter cuidado com os riscos de efeito salino, os quais, em muitos casos, têm sido responsável pela diminuição da população de plantas.
 
 Foto: Geovani B. Amaro
Adubação de cobertura em lavoura de pimenta.
 Figura 2. Adubação de cobertura em lavoura de pimenta.
 
Tabela 3. Classes de interpretação da disponibilidade para alguns micronutrientes
Micronutriente Classificação Resultado da Análise
   Minas Gerais São Paulo Cerrado
mg dm-3
-
Boro (B) Muito Baixo ≤ 0,15    
Baixo 0,16 - 0,35 < 0,20 < 0,20
Médio 0,36 - 0,60 0,20 - 0,60 0,30 - 0,60
Alto 0,61 - 0,90 > 0,60 > 0,50
Muito Alto > 0,90    
Cobre (Cu) Muito Baixo  ≤ 0,30    
Baixo  0,40 - 0,70 < 0,20 < 0,40
Médio  0,71 - 1,20 0,30 - 0,80 0,50 - 0,80
Alto  1,21 - 1,80 > 0,80 > 0,80
Muito Alto  > 1,80    
Manganês (Mn) Muito Baixo  ≤ 2,0    
Baixo  2,1 - 5,0 < 1,2 < 1,9
Médio  6,0 - 8,0 1,3 - 5,0 2,0 - 5,0
Alto  9,0 - 12,0 > 5,0 > 5,0
Muito Alto  > 12,0    
Zinco (Zn) Muito Baixo  ≤ 0,40    
Baixo  0,41 - 0,90 < 0,5 < 1,0
Médio  0,91 - 1,50 0,5 - 1,2 1,1 - 1,6
Alto  1,51 - 2,20 > 1,2 > 1,6
Muito Alto  > 2,20    
Fonte: Adaptado de Raij et al. (1997); Fontes (2000); Cantarutti et al. (2007).
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
 
Semelhante às demais hortaliças a pimenta demanda alta quantidade de nutrientes. Para uma produtividade média de até 16 t ha-1, por exemplo, as quantidades de N, P, e K exportadas na colheita giram em torno de 2,0, 0,4 e 2,0 kg t-1, respectivamente. Com isso, fica clara a importância da restituição dos nutrientes exportados pela cultura, além de uma dose de sustentabilidade para evitar o uso da reserva natural de nutrientes do solo.
A estimativa das quantidades de adubo a serem adicionadas no solo deve ser baseada principalmente na análise química do solo que serve de subsídios para o técnico na interpretação correta das faixas de fertilidade do solo.
O uso excessivo de fertilizantes não é danoso apenas devido aos problemas ambientais e desperdício de recursos. Da mesma forma que ocorre em seres humanos, o excesso de nutrientes é prejudicial ao bom desenvolvimento da pimenteira e pode comprometer a produção da mesma forma que a falta de nutrientes.