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15/07/15 | Nanotecnologia
Nanofibras de dendê
Elas são cristalinas e têm alta resistência mecânica. O desafio é aumentar a escala e o rendimento e testar sua aplicação como reforço de outros materiais
Diferentemente da tradicional parábola da criança e do cientista, na qual o pesquisador passa grande parte do tempo sozinho no laboratório para "conquistar e consertar" o mundo, a rotina tende a ser muito mais estimulante. Ela é repleta de surpresas e conflitos. Para o pesquisador Leonardo Fonseca Valadares, da Embrapa Agroenergia, a rotina de laboratório é multifacetada, motivada por desafios e aprendizado em longo prazo. "A rotina não é entediante. O trabalho tem várias etapas: um dia você está planejando, no outro executando, depois tratando os dados; em seguida, está discutindo sobre os resultados. Quando se chega a uma conclusão, tem-se novas ideias para planejar novos experimentos e novos projetos. É um processo bem dinâmico".
Leonardo é líder de uma pesquisa iniciada em abril de 2012 com o objetivo de extrair nanofibras de celulose de cachos vazios de dendê. A palma-de-óleo ou dendezeiro é uma planta com potencial de integrar a cadeia produtiva de biodiesel, graças à alta produtividade. Ela pode render até seis toneladas de óleo por hectare. A soja, por exemplo, gera entre 500 e 600 quilos no mesmo espaço. No entanto, para cada tonelada de óleo, gera-se 1,1 tonelada de cachos vazios, usados na fertilização do solo. O objetivo é obter maior valor agregado utilizando esse material.
No laboratório, o trabalho começa com a extração da celulose, por meio de processos de purificação. A equipe consegue obter material muito semelhante ao papel. A etapa seguinte é a extração das nanofibras. "As nanofibras dos cachos vazios têm espessura nanométrica. Nós utilizamos microscópios para vê-las e caracterizá-las", explica Leonardo.
Já se sabe que as nanofibras dos cachos de dendê são cristalinas e possuem alta resistência mecânica, comparável a certos metais. A Embrapa Agroenergia quer testá-la como reforço para a borracha natural. A dificuldade tem sido a baixa quantidade de nanofibras obtidas. O problema é que é preciso uma sequência de extrações. Primeiro, purifica-se a celulose, que já é uma fração do material. Em seguida, são separadas apenas as nanofibras, que constituem uma porção menor ainda. "Ainda assim, a gente esperava conseguir uma quantidade maior, mas percebemos que não vai ser tão fácil ".
Aumentar a escala e o rendimento é a próxima etapa do trabalho que, além de continuar no laboratório, deve passar a ser desenvolvido também na área de plantas-piloto da Embrapa Agroenergia. Testar a aplicação das nanofibras como reforço de outros materiais além da borracha natural também está nos planos da equipe.
Otimizar o processo para que as condições e custos sejam compatíveis com a realidade industrial é um desafio intenso pelo qual terá que passar esta e qualquer outra pesquisa em que se queira levar um produto ao mercado. Leonardo explica que, nas fases iniciais do desenvolvimento, no laboratório, usam-se os melhores reagentes e insumos, na quantidade que for necessária para chegar ao resultado. Depois começam os estudos para ajustar os processos, até que se atinja escala, condições e custos adequados.
Para o pesquisador, as conquistas ultrapassam os resultados científicos. Estão também na estruturação dos laboratórios, no contato com pesquisadores, no seu desenvolvimento pessoal, na observação do amadurecimento dos estudantes, na convivência com pessoas de outras áreas. Dessa interação surgiu uma nova vertente: a rota enzimática.
O processo de obtenção de nanofibras pode ser feito utilizando ácidos ou enzimas. Por serem produzidas por microrganismos, as enzimas possuem baixa toxicidade e são de fácil tratamento e descarte. A destinação final de efluentes de processos ácidos, em contrapartida, exige neutralizações para não comprometer corpos d´água. Além disso, a manipulação de ácidos é mais perigosa tanto no laboratório quanto nas indústrias. "Como eu não tinha experiência nessa área, nunca pensei que conseguiríamos obter nanofibras utilizando enzimas, mas conseguimos", conta Valadares que, como químico, atuava principalmente com substâncias inorgânicas.
Para Leonardo, toda pesquisa é surpreendente. Mesmo com planejamento, não há garantias de que se chegará a determinado resultado. Na pesquisa em questão, havia inclusive o risco de não se conseguir extrair as nanofibras. Mas, surpreso de fato, o cientista ficou ao descobrir que elas são extremamente longas e finas por causa das próprias características da matéria-prima. Isso confere propriedades diferenciadas ao produto.
No ambiente de laboratório, obter produtos diferentes dos previstos não é necessariamente negativo. "Não existe erro. Existe resultado. E você vai tentar descobrir como chegou a ele", diz Leonardo. Quando era estudante, "uma reação ‘deu errado' e coagulou dentro do balão. Achei péssimo, não era o esperado". O professor, com décadas de experiência, não condenou o resultado. Pelo contrário, chamou a atenção para o fato de que o material era resistente a solventes, algo inesperado. "A resistência a solventes foi então analisada profundamente e se tornou tópico da tese e de publicação".
A conversão da biomassa em energia e diversos produtos químicos e materiais está no cerne do trabalho da Embrapa Agroenergia. Mas, até ingressar na Unidade, em 2010, Valadares trabalhava com materiais bem diferentes, como a argila. O jovem pesquisador gostou da mudança de área. "Não criamos nanofibras, elas estão dentro das plantas. A natureza é fonte de inspiração para todo cientista".
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Vivian Chies
Embrapa Agroenergia
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