Embrapa Agroindústria Tropical
Pesquisa desenvolve bebida de maçã com lactobacilos vivos
Pesquisadores da Embrapa Agroindústria de Alimentos (RJ) e da Embrapa Uva e Vinho (RS) desenvolveram uma bebida de maçã com lactobacilos vivos e que não precisa de refrigeração. Até agora, no Brasil, somente alimentos lácteos contêm esse microrganismo benéfico à flora intestinal. O novo produto atende consumidores com alergias e intolerâncias a leite e seus derivados ou pessoas com restrições alimentares.
Produzida com suco integral da fruta e probióticos encapsulados, a nova bebida possui dupla funcionalidade: o suco de maçã é reconhecidamente benéfico à saúde humana, devido aos seus compostos bioativos, e os probióticos auxiliam no equilíbrio da microbiota intestinal e na prevenção de várias doenças. No momento, a Embrapa está em busca de parceiro para finalizar o desenvolvimento tecnológico e colocar o produto no mercado.
Atualmente, as bebidas com probióticos disponíveis no mercado brasileiro são lácteas, fermentadas e têm de ser armazenadas sob refrigeração. “O objetivo era produzir uma bebida não láctea e não fermentada com probióticos, que pudesse ser armazenada em temperatura ambiente. Testamos treze diferentes formulações, utilizando sucos de duas variedades de maçã (Gala e Fuji), e duas diferentes tecnologias de processamento, até identificar a formulação ideal”, diz Janine Passos, pesquisadora do Laboratório de Microbiologia da Embrapa Agroindústria de Alimentos e líder da pesquisa.
A composição final foi escolhida por causa de suas propriedades, da vida útil prolongada e dos resultados dos testes realizados com consumidores. A base é de suco de maçã integral da cultivar Fuji utilizando-se o processo de encapsulação de bactérias do gênero Lactobacillus, com pasteurização e enchimento a quente.
Um dos diferenciais do produto é a sua vida útil de 12 meses, armazenado em temperatura ambiente. As bebidas com probióticos existentes no mercado devem ser conservadas sob refrigeração até 10 °C e apresentam vida útil média de apenas 35 dias.
Boa aceitação dos consumidores
Foram realizados três testes de avaliação sensorial da bebida de maçã com probióticos com os empregados da Embrapa Agroindústria de Alimentos, além de um teste final com 114 consumidores em uma rede de supermercados da cidade do Rio de Janeiro. As formulações melhor avaliadas internamente foram submetidas aos consumidores externos. Desses, 61% já consumiam alimentos probióticos.
Os resultados mostraram que a presença de bactérias probióticas não alterou o sabor do suco integral de maçã e ainda agregou propriedades benéficas à saúde. A aceitação do produto foi elevada. "A nota média obtida foi 8,05 em uma escala de 1 a 9, o que representa o conceito ‘muito bom’. E as características ressaltadas pelos participantes foram ‘sabor de maçã’ e ‘doçura ideal’”, informa Daniela Freitas, pesquisadora do Laboratório de Análise Sensorial e Instrumental da mesma Unidade da Embrapa, que realizou os testes.
Além disso, cerca de 95% dos consumidores concordaram que estavam provando uma bebida saudável e com capacidade de prevenir doenças, por se tratar de um alimento com probióticos. “Nossos estudos demonstraram, contudo, que a decisão de compra ainda está mais atrelada à palatabilidade do que à saudabilidade. Ou seja: a preferência do consumidor ainda se dá pelos alimentos que mais agradam o paladar, e não pelos mais saudáveis. Portanto, o ideal é reunir as duas características, como ocorreu nesse novo produto”, pondera Daniela.
Probióticos microencapsulados
Para que os probióticos mantivessem sua viabilidade após a pasteurização e durante a vida de prateleira do suco, foi utilizado o processo de microencapsulação por gelificação iônica. Os microrganismos foram envolvidos em microcápsulas compostas por alginato, gelatina e oligofrutose, de forma a ficarem protegidos contra as condições externas adversas. A oligofrutose é conhecida por suas propriedades prebióticas, contribuindo, assim, para a manutenção da viabilidade dos probióticos.
As microcápsulas de gel foram desenvolvidas na Planta-Piloto de Processamento de Alimentos da Embrapa Agroindústria de Alimentos, pela pesquisadora Renata Tonon, em parceria com a professora Ana Carla Sato e a mestranda Karen Silva, do programa de Pós-Graduação em Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que fizeram um estudo que definiu a melhor composição dos géis. “A microencapsulação por gelificação iônica é um processo simples, mas ainda pouco utilizado na indústria de alimentos no Brasil. É interessante para a adição de compostos que necessitem de liberação controlada, ou que precisem se manter protegidos durante o processamento e a estocagem, como na bebida de maçã. No caso dos probióticos, é importante ainda garantir que eles sobrevivam à passagem pelo trato gastrointestinal”, conta Tonon.
Os testes de bioacessibilidade da bebida de maçã com probióticos comprovaram essa proteção. “Os resultados obtidos na simulação da digestão in vitro demonstraram que os microrganismos encapsulados sobreviveram melhor à passagem no aparelho gastrointestinal que os probióticos não encapsulados, nas condições avaliadas, sendo liberados apenas no intestino, onde devem exercer a atividade probiótica”, relata a pesquisadora Flávia Gomes, do Laboratório de Bioacessibilidade da Embrapa Agroindústria de Alimentos, que realizou o estudo.
Agora, a pesquisa prossegue para testes clínicos para comprovar os benefícios do consumo da bebida de maçã com probióticos para a saúde humana. A comercialização e a alegação funcional no rótulo do alimento, para serem autorizados pela Agência da Vigilância Sanitária (Anvisa), dependem dessas comprovações científicas. Os ensaios clínicos necessários para a comprovação do efeito probiótico da bebida de maçã serão realizados pela equipe do Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), nos próximos meses.
Mais valor ao suco de maçã integralComo ocorre em muitos países, inclusive no Brasil, a extração do suco constitui uma alternativa de diversificação e aproveitamento de frutos descartados no processo de classificação do fruto in natura. O desenvolvimento de novos produtos agrega valor à cadeia produtiva, aumentando a produtividade agroindustrial. “O suco de maçã com probióticos contribui para diversificar a oferta de alimentos funcionais, possibilitando o acesso das indústrias de sucos de frutas pasteurizados ao mercado de produtos com probióticos”, afirma Esdras Sundfeld, chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agroindústria de Alimentos. O suco de maçã utilizado no desenvolvimento desse novo produto foi produzido no Laboratório de Inovação Enológica (LIE), na Embrapa Uva e Vinho, em Bento Gonçalves, (RS), utilizando maçãs colhidas na Estação Experimental de Fruticultura de Clima Temperado em Vacaria (RS). Para produzir a bebida são utilizadas frutas com pequenos danos e injúrias, classificadas na categoria 3, mas que preservam todos os seus nutrientes. Não há qualquer adição de açúcar ou conservantes. “Além dos sucos integrais com ou sem probióticos, trabalhamos no desenvolvimento de novos produtos à base de maçã, como sidra e destilado (brandy)”, conta César Luis Girardi, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho e integrante da pesquisa. Segundo ele, ao oferecer ao agricultor um produto com alto valor agregado, a pesquisa contribui para aumentar a competitividade e sustentabilidade econômica, social e ambiental da cadeia produtiva da maçã. “Essa é uma demanda que vem sendo discutida e apoiada pela Associação Brasileira de Produtores de Maçã (ABPM) e Associação Gaúcha de Produtores de Maçã (Agapomi)”, conta Girardi. Segundo o Anuário Brasileiro da Maçã da ABPM, a produção nacional alcançou 1,1 milhão de toneladas em 2018, sendo que cerca de 90% da produção nacional de maçã está concentrada nos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina e envolve duas variedades: Gala e Fuji. O Brasil também exporta a fruta in natura. |
Aline Bastos (MTb 31.779/RJ)
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