Diversidade agroalimentar centralizou discussão em live da Embrapa
Diversidade agroalimentar centralizou discussão em live da Embrapa
Convidados e espectadores promoveram um rico debate sobre os nexos entre produção de alimentos e a cultura alimentar nos territórios brasileiros
Uma verdadeira aula sobre as potencialidades agroalimentares do Brasil. Foi essa a sensação de boa parte dos internautas que assistiram online a live “Alimentos & Territórios”, ocorrida no último dia 29 no canal corporativo da Embrapa no Youtube. “Sou Nutricionista e precisamos fazer essa conexão com os gastrônomos, agrônomos, técnicos agrícolas”, escreveu no bate-papo da transmissão Luziene Silva, professora da disciplina Gestão e Planejamento de cardápio de turma de gastronomia no Pará.
O vídeo, que continua disponível nesse link , já ultrapassou a casa das mil visualizações, e, durante mais de 80 minutos, colocou num mesmo ambiente virtual a chef de cozinha carioca, fundadora do Instituto Maniva, Teresa Corção e o diretor do SEBRAE-AL e ex-ministro de Turismo, Vinícius Lages. Eles interagiram livremente com o agrônomo João Flávio Veloso sobre uma gama muito variada de abordagens em torno dos nexos existentes e possíveis entres a pesquisa científica agroalimentar, a rica variabilidade gastronômica brasileira e as diversas oportunidades de arranjos interinstitucionais, governamentais e da sociedade civil, a partir do tripé alimentos, territórios tradicionais e nutrição saudável.
“Eu gosto de pensar que o alimento é nossa energia número um. Vem antes do petróleo, vem antes de qualquer outra energia, porque ela é o que nos mantém vivos”, disse Teresa no início de sua fala. Corção revelou que a lógica de sua culinária mudou realmente quando ela passou a perceber a importância dos agricultores. “Isso fez uma mudança total na minha vida”, garante. “Eu comecei a perceber, então, que o alimento, além de ser nossa energia número um, é aquilo que nos conecta”, acrescenta.
Uma das principais difusoras da culinária à base de mandioca, Teresa contou a história de como as variedades da planta começaram a ser espalhadas, especialmente na região amazônica, quando as manivas eram usadas pelas tribos como dotes nos casamentos intertribais. “Ela é o início, o primeiro degrau da nossa socioagrobiodiversidade”, afirma a culinarista.
Alimento brasileiro
Roberto Smeraldi, fundador do Instituto ATÁ, foi outro chef de cozinha que fez um depoimento exclusivo para a live em comemoração ao segundo ano das atividades da Embrapa Alimentos e Territórios. “A gente consegue inovar mesmo é com ingredientes e quem proporciona o ingrediente pra nós é a biodiversidade. A biodiversidade entre ecossistemas, entre as espécies e entre as variedades da mesma espécie”, afirma.
“Nós temos que desenvolver trabalhos, comunicação, pesquisas, aprofundamentos para que fique claro pra todo mundo para que os cozinheiros possam se divertir, possam proporcionar inovação, possam atender demandas do mercado. Temos que oferecer o conhecimento ao mundo dos cozinheiros, pra que cada um possa inovar e avançar”, propõe Smeraldi.
Vinícius Lages traz uma visão diferenciada à discussão. Ele lembrou que a bio-economia regional nordestina, baseada inicialmente na monocultura da cana-de-açúcar, gerou uma paisagem pouco diversificada, diminuído as potencialidades agroalimentares do bioma Mata Atlântica.
Lages fez uma fala ressaltando as potencialidades e oportunidades ainda a explorar de uma imensa gama de negócios ligados aos alimentos. Ele destacou o papel dos chefs de cozinhas na mediação com essa sociobiodiversidade do Brasil. “Nós nos comemos há muito pouco tempo. Nós comemos o Brasil, na sua diversidade, há muito pouco tempo. E isso é um desafio grande em termos cadeias estruturadas de fornecimento. Ter esses insumos disponíveis”, comentou.
Vinícius considera que o novo centro de pesquisas tem uma missão importantíssima no mapeamento dessa potencialidade, fazendo os censos dessa biodiversidade trazendo esses repertórios para mais perto dos mediadores. “Nosso interesse maior aqui é estimular food-labs que possam dar suporte a novas agritechs e food-techs, que possam ter nessa fonte rica de alimentos que deve sair desses mapeamentos incrementos para surgimento de novos modelos negócios”, confirmou Lages numa de suas falas iniciais.
João Flávio ressaltou o suporte do SEBRAE no fomento aos projetos iniciais do novo centro de pesquisas, especialmente num trabalho inicial que já está sendo realizado que pretende “(...) jogar uma luz nos produtos agroalimentares diferenciados que o Brasil possui, porque há uma carência muito grande desse tipo de informação. Nós queremos montar uma plataforma digital com informações qualificadas dos produtos, começando, inicialmente por Alagoas, Sergipe e Pernambuco”, ressaltou.
Comer nos territórios
Tereza Corção também manifestou sua preocupação no sentido de que esse esforço das instituições em promover alimentos típicos, diferenciados, possa refletir, antes de tudo, na possibilidade de que as pessoas dos territórios se alimentem das comidas dos seus territórios, da biodiversidade desses territórios. “O que vemos hoje é muito preocupante: nos territórios come-se muito mal, muitas vezes. Comidas industrializadas que não são ideais para a saúde”, destacou. Ela divulgou o vídeo do projeto “Gosto da Amazônia – Sabor que preserva a floresta”, sobre a comercialização de pirarucu, com um trabalho feito junto à nação Paumari.
Para Vinícius Lages, é preciso ter em mente também as conceituações do slow-food. “O desafio desse trabalho é promover modelos do tipo ‘ganha-ganha’ e tentar equilibrar consumo local com conquista de outros mercados. É assegurar que a descoberta de um produto desses, a descoberta de uma receita local, ela, ao ser apropriada e entre numa escala de comercialização muito acentuada, ela possa não deslocar a população da capacidade de continuar consumindo aquele produto”, analisa.
Ele acrescenta que é fundamental valorizar os nexos entre esse tipo de pesquisa com as dimensões social e da ecologia humana para que esse processo não gere uma disrupção e desorganize os sistemas alimentares seculares que aí existem, simplesmente por essa curiosidade ou desejo de transformar isso numa moda alimentar.
João Flávio alertou que o desinteresse nos alimentos diferenciados coloca em risco o desaparecimento de um número considerável dos chamados “artesãos de alimentos”. Teresa Corsão acha que um possível antídoto para esse risco seriam os modelos de comercialização justa. “É preciso botar tecnologia na ponta urbana, mas também na ponta rural”, avalia a chef de cozinha.
Biomas socioculturais, como o Sertão do Nordeste, também foram lembrados como territórios importantes nessa perspectiva de anexar alimentos típicos, culturas alimentares tradicionais e oportunidades de novos negócios gastronômicos em torno de receitas seculares. Vinícius Lages lembra que muita gente viaja para comer coisas diferentes. “O Brasil se tornou uma potência do agronegócio, mas não é ainda uma potência gastronômica. E pode ser, se nós pudermos trabalhar essa biodiversidade e transformar esse repertório em negócios alimentares e em experiências interessantes”, afirma.
“A não valorização pode sim levar a perda de variedades, de modos de cultivar. Por isso a criação desse novo centro de pesquisa da Embrapa é uma oportunidade, por termos uma unidade dedicada a articular o alimento com o território, juntando gente talentosa para a gente puder virar essa página”, acrescentou Lages.
Teresa diz que a manutenção das culturas alimentares é indispensável para o fomento desse tipo de negócio. “As receitas são tão importantes quanto os produtos. A receita é o produto virando comida. Essas culturas que não perderam seus vínculos com suas receitas, elas acabaram não perdendo o vínculo com os produtos”, observa.
Interação
Além da rica discussão proporcionada pelos protagonistas convidados da Embrapa, a live proporcionou ainda uma interação muito proativa com espectadores que assistiram durante a transmissão online. “Como a Unidade pode contribuir para que as espécies da biodiversidade brasileira deixem de ser ‘plantas do futuro’ e se tornem geradores de valor atual para a sociedade?”, questionou Ana Paula Jacques.
Já Frederico Ozanan Durães quis saber quais seriam as boas apostas, em termos de alimentos e de alimentação, que atendam as necessidades das famílias, as culturas regionais e a variabilidade da matéria-prima alimentar. E Cris Scofano ressaltou que “(...) comida é cultura, é afeto, é memória! Nossa sociobiodiversidade é nossa maior riqueza. O trabalho de pesquisa é fundamental. Resgate de receitas através de uma arqueologia gastronômica”.
Virgínia Virtes acha que os alimentos biofortificados precisam ser implantados em mais áreas do Brasil. Ela defendeu também que as cadeias de produção do amendoim e gergelim precisam ser desenvolvidas. Fátima Aguiar, do Programa Alagoas Maior, acha que “(...) Temos que retornar as origens e nos alimentar melhor, saudavelmente, resgatando nossas origens”.
“A Identificação de origem e outras formas de agregação de valor e rastreabilidade dessa sociobioeconomia é um aprendizado para nós, brasileiros. Como aproveitar as tecnologias da informação para aproximar, sem tanta desconstrução cultural, a produção numa escala sustentável?”, questionou Valéria Hammes.
Para Katia Karam, é preciso garantir prioritariamente a questão da segurança alimentar e nutricional e da soberania alimentar do povo brasileiro. Já Maurício Lopes acredita que existe um enorme desafio de organizar “(...) o rico leque de saberes, sabores e aromas que conformam um patrimônio cultural ainda pouco reconhecido”. Ele diz que a Embrapa Alimentos e Territórios poderá contribuir para a ampla difusão da cultura alimentar brasileira e suas possibilidades de inclusão, renda e progresso para o Brasil.
Ana Maria Tomazoni recomendou a Rota do Cambuci em muitos municípios com Mata Atlântica de São Paulo e Suziane Lima ressaltou que “(...) o Cariri cearense é rico em cultura, só precisa agregar valor a seus produtos locais”.
DALMO OLIVEIRA (0859 (MTE-PB))
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