Artigo - A Mandioca de todos os dias
22 de abril é o dia da mandioca.
Mas para os amazônidas, a mandioca é o pão nosso de cada dia.
Raimundo Brabo*
Na forma de farinha, com chibé e camarão, com pirão escaldado e peixe, com pirão de açaí, na farofinha com espetinhos de churrasco.
Orgulhosamente, o paraense se autodenomina de “papa-chibé”.
Imaginem se faltar farinha.
Há uma comoção regional, pelo fato de algumas pessoas não conseguirem sequer comer sem farinha de mandioca. Isso já ocorreu no século passado provocando enormes filas para se conseguir um quilo de farinha, como se fora um troféu.
E o consumo diário de mandioca pelos amazônidas continua.
Na degustação da tapioquinha com café, do tacacá de todas as tardes, na maniçoba e pato no tucupi das confraternizações, do molho de tucupi com pimenta, na forma de bolos, pudins, sorvetes, broas e biscoitos.
A utilização da mandioca na forma mais diversificada e como alimento é particularidade dos paraenses, uma herança herdada de nossos ancestrais indígenas, cujo processo tecnológico de domínio da cultura vem desde a seleção do material genético de propagação para os plantios, até os processos de transformação em alimentos para o consumo humano e animal.
A seleção dos indígenas foi tão criteriosa que resultou em cultivares não venenosas para consumo in natura e até cultivares de alta concentração cianogênica, que só podem ser transformadas em alimentos após a trituração e torragem, para eliminação de sua toxicidade.
O Brasil é o berço de origem da mandioca para o mundo, um legado das populações indígenas para à moderna civilização. Posteriormente - com o intercambio dos colonizadores – a mandioca foi introduzida no continente africano e posteriormente no sudeste asiático.
Só existem na natureza duas espécies animais que na evolução são identificadas como agricultoras natas: as formigas e os térmitas, que cultivam um cogumelo, cujas secreções são a fonte de substâncias açucaradas que lhes servem de alimentos. Algumas formigas até são criadoras de pulgões, que também lhes oferecem essas doçuras.
O homem teve que aprender a cultivar as plantas e parece que nossos ancestrais amazônidas quando dominaram a mandioca como fonte de carboidratos na sua alimentação, não mais a abandonaram levando sempre umas manivas para multiplicação por onde quer que fosse a sua migração, semelhante às formigas que transportam sempre alguns inoculos do cogumelo (fungo), quando mudam de formigueiro.
A cultura da mandioca no Brasil é a sétima em área cultivada e a primeira em importância social, pela geração de renda e milhões de empregos, estando presente na agricultura de todos os estados brasileiros.
O Estado do Pará é o maior produtor do Brasil, com área cultivada de 300.000 de hectares e produção de 4,9 milhões de toneladas anuais. O consumo de mandioca no Pará é o mais diversificado do mundo, sendo o alimento de maior participação na culinária regional.
O dia a dia dos mandioqueiros se faz de limpar a roça, plantar, capinar, colher, descascar, ralar, prensar, peneirar, torrar, cozer, classificar, embalar, transportar e comercializar. Para outros pesquisar e ensinar.
De 21 a 25 de novembro deste ano, será realizado em Belém o XVII Congresso Brasileiro de Mandioca, com o tema “Sabores e Cheiros da Amazônia”, como reconhecimento do valor antropológico dessa nobre cultura em nossa região e no Brasil.
A mandioca é das mais importantes para a redução da fome de populações carentes na África, tanto que a Bill & Melinda Gates Foundation tem um relevante trabalho de pesquisa e fomento dessa cultura para elevar a produtividade, a qualidade e os nutrientes funcionais dessa raiz, para mitigar a tragédia da fome nesse continente.
A mandioca impressionou tanto a Bill Gates - que este ano foi eleito novamente o homem mais rico do mundo -, dado a importância por ele dispensada para a cultura desse tubérculo, como ferramenta de seu trabalho social, referindo-se com entusiasmo a esta dádiva da Natureza como “o mais interessante vegetal do mundo”.
Para brindar nossos clientes no dia da mandioca, a Embrapa Amazônia Oriental disponibiliza em seu site o livro “Cultura da Mandioca”, que trata de todos os assuntos referentes ao sistema de produção e de processamento da mandioca. O livro pode ser acessado gratuitamente no site da Embrapa.
* Pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, escritor e autor do blog Amazônia em Devaneios
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