O monitoramento de pragas e doenças durante o manejo da cultura do pimentão é capaz de reduzir em torno de 30% a aplicação de produtos químicos na lavoura. A constatação é do entomologista Jorge Anderson Guimarães, responsável pelas pesquisas relacionadas à produção integrada na Embrapa Hortaliças (DF). A prática é um dos procedimentos recomendados pela produção integrada do pimentão (PIP) (veja quadro abaixo) e proporcionou a economia ao ser associada a outras medidas como o controle biológico de pragas. “Além de diminuir os custos com o uso dos insumos, essas práticas atendem a outra preocupação desse sistema de cultivo: assegurar a saúde do produtor”, explica o pesquisador, acrescentando que o agricultor geralmente opta pela aplicação pré-definida de produtos químicos, conhecida como “calendários de aplicação”. De acordo com Guimarães, essa prática, que não se resume ao pimentão, tem como consequência o uso desnecessário de produtos químicos, algumas vezes não registrados para a cultura. “Basicamente, esses dois procedimentos que vieram à tona nos relatórios do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) podem ser corrigidos com a adoção da produção integrada, uma vez que ela disciplina o uso de produtos químicos, restringindo a utilização àqueles recomendados e registrados”, explica o pesquisador. Alta Qualidade Frutos padronizados, sadios e com garantia de procedência e certificação. O passo a passo para que o pimentão de alta qualidade seja regra e não exceção no mercado brasileiro está contemplado na Instrução Normativa nº 40 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) - Norma Técnica Específica (NTE), que regulamenta a Produção Integrada do Pimentão (PIP), publicada no segundo semestre do ano passado. No último relatório do PARA, referente ao período 2013/2015, foram analisadas em todo território nacional 243 amostras de pimentão, sendo que 214 delas apresentavam resíduos de agrotóxicos não autorizados para a cultura. Dessas, 21 foram consideradas insatisfatórias exclusivamente por conter resíduos não autorizados, mesmo em concentrações inferiores a 0,001 mg/kg. A gerente de Monitoramento e Avaliação do Risco da Gerência-Geral de Toxicologia da Anvisa, Adriana Pottier, reforça que alimentos resultantes de cadeias produtivas mais organizadas têm apresentado melhores resultados nos relatórios do PARA. Adriana lembra que quando foram realizados os primeiros relatórios existiam poucos agrotóxicos registrados para a cultura, ressaltando que os índices são relacionados a parâmetros agronômicos. Ela reforça que a Anvisa recomenda ao consumidor escolher alimentos da estação e que apresentem informações de origem. Outra orientação é redobrar os cuidados com a higienização dos produtos em casa. Origem da solução O pimentão está entre as quatro hortaliças mais sensíveis a pragas e doenças, com o agravante de existirem poucos produtos químicos registrados especificamente para a cultura. As consequências dessas duas questões se refletiram nos relatórios do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos da Anvisa, divulgados a partir de 2010. Os resultados apresentaram amostras de pimentão com altos índices de contaminação em virtude do uso de produtos químicos não registrados para a cultura e com limites de resíduos acima dos permitidos pela legislação. Esses resultados impulsionaram a demanda do ministério para que fosse elaborada a PIP, no início de 2013, com a assinatura do Termo de Execução Descentralizado (TED) entre o ministério e a Embrapa Hortaliças. Com a missão de estabelecer as boas práticas para essa cultura - que em 2017 ocupava uma área de 11.188 hectares em todo o Brasil e com produção de 555 mil toneladas -, pesquisadores da Embrapa Hortaliças (DF), com o apoio de técnicos da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF) e de agricultores, identificaram os principais problemas enfrentados pelos produtores do Núcleo Rural de Taquara – maior produtor de pimentão do Distrito Federal. Os dados coletados em visitas e reuniões subsidiaram a elaboração de um conjunto de boas práticas agrícolas para a PIP, que estão contempladas em 12 publicações e relacionadas no documento “Normas Técnicas e Documentos de Acompanhamento da Produção Integrada do Pimentão”, editado pela Embrapa Hortaliças. As diretrizes sobre o processo de adoção da produção integrada do pimentão também constam na publicação. Passo a passo para cumprir a produção integrada A Norma Técnica Específica da PIP contempla 18 áreas, nas quais estão definidos os requisitos obrigatórios, recomendados e proibidos para cada etapa do sistema de produção integrada. Para viabilizar esse sistema de produção, no qual se pode obter a certificação do produto com o selo “Brasil Certificado”, a NTE da PIP exige a aplicação de boas práticas agrícolas durante todas as fases de cultivo, colheita e pós-colheita. Essas boas práticas foram elaboradas por pesquisadores da Embrapa Hortaliças em parceria com a Emater-DF e outros parceiros. O documento orienta os produtores sobre os procedimentos que devem ser tomados com relação a vários processos, como irrigação, nutrição e manejo do solo, monitoramento e manejo de pragas e doenças, orientações para a aplicação de agrotóxicos, manuseio dos frutos na pós-colheita e coleta de amostras para análises de resíduos. “Essas práticas possibilitam o manejo adequado desde a etapa de cultivo até a disponibilidade do alimento para a comercialização”, observa o pesquisador, enfatizando que qualquer agricultor pode implementar as boas práticas, independentemente da adesão à produção integrada. Todas as ações realizadas na condução da lavoura devem ser registradas em “cadernos de campo”. São essas anotações que vão possibilitar ao produtor atender às categorias “Registro de informações” e “Rastreabilidade”. Elas são exigidas no momento da etapa de fiscalização, que é realizada por meio de empresas credenciadas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) para a avaliação da conformidade e obtenção da certificação. A produção integrada no Brasil A Produção Integrada Agropecuária (PI-Brasil) contempla atualmente a cerca de 30 culturas, especialmente frutíferas para exportação, mas há também hortaliças, grãos, flores, plantas ornamentais, tabaco e produtos de origem pecuária. No Brasil, a PI passou a ser adotada em 2001 pela cadeia de frutas, seguindo os moldes do sistema que surgiu na Europa no fim da década de 1970. O agrônomo da Emater-DF Fabiano Carvalho foi um dos técnicos que contribuiu para a definição da classificação (obrigatório, recomendado, proibido) dos procedimentos que constam na Norma Técnica. Ele considera a produção integrada viável e relata que, pela sua experiência, as adequações que precisam ser efetivadas pelo agricultor estão relacionadas mais a procedimentos do que a investimento financeiro. “Percebemos que os produtores melhoram os processos de gestão e passam a conhecer a sua produção ao adotar medidas simples como o registro das decisões tomadas durante o cultivo”, enfatiza Carvalho. O técnico da Emater Carlos Banci, envolvido nas discussões sobre a elaboração do sistema de produção integrada, reforça que aqueles que buscam seguir as recomendações, principalmente, relacionadas às ações gerenciais, estão tendo resultados melhores que a média dos agricultores. Próximos passos Com a publicação da norma técnica específica e a disponibilização das boas práticas, os especialistas planejam a implantação de unidades demonstrativas em propriedades rurais. A fase posterior envolve treinamentos de técnicos e de produtores interessados em adotar o sistema de produção integrada. “É um processo que demanda tempo entre a adoção e a implementação de todos os itens listados na NTE até alcançarmos a etapa final de auditoria das propriedades por certificadoras acreditadas pelo Inmetro e a obtenção do selo”, reconhece o pesquisador da Embrapa. “O hábito do brasileiro de apalpar os frutos e selecionar os melhores ocorre porque não existe essa padronização” Cenário favorável para a PI no Brasil O pesquisador Jorge Guimarães acredita que esse sistema deve se beneficiar da publicação de duas instruções normativas sobre rastreabilidade e oferta de alimentos padronizados e de qualidade para comercialização, publicadas no ano passado. Os procedimentos que possibilitam a rastreabilidade ao longo da cadeia produtiva de produtos vegetais frescos, para fins de monitoramento e controle de resíduos de agrotóxicos, consta na Instrução Normativa Conjunta nº 02/2018, do ministério e da Anvisa. “Essa medida vem ao encontro do que preconiza a PI, ao exigir do produtor o registro dos dados desde as fases de plantio até a pós-colheita. Ela tende a beneficiar também os produtores, uma vez que possibilita identificar a origem do problema em casos de irregularidades”, enfatiza. O especialista acrescenta que a IN nº 69/2018 também está alinhada ao resultado final do que propõe a produção integrada, que é oferecer produtos de alta qualidade. A medida prevê que mais de 50 produtos hortícolas comercializados no varejo ou no atacado tenham requisitos mínimos de qualidade, como padronização e estágios iguais de maturação. Para ele, o hábito do brasileiro de apalpar os frutos e selecionar os melhores ocorre porque não existe essa padronização. “Essas normativas permitirão o estabelecimento dos pilares para o avanço da produção integrada do pimentão, assim como de outras culturas no Brasil”, frisa. Sistema de cultivo exige produtores com perfil diferenciado O pesquisador Jorge Guimarães ressalta que a adesão à produção integrada é voluntária e requer agricultores com perfil diferenciado, comprometidos com a oferta de produtos de qualidade superior, considerando a sustentabilidade da produção e do meio ambiente. Os interessados devem se adequar às normas da PI e, entre outros compromissos, assinar contrato com empresa certificadora, registrar as atividades desenvolvidas na área de produção e fornecer amostras para análises de resíduos. Para o especialista, a produção integrada requer uma mudança de mentalidade ao considerar que o retorno financeiro não está propriamente no valor de venda do produto, e sim na melhoria da gestão da propriedade e na economia obtida com a realização das boas práticas. “A PI pressupõe mecanismos de monitoramento, análise de solos e de outros itens para avaliar a necessidade real do uso de insumos. O ganho na PI é decorrente, muitas vezes, do que o produtor deixou de gastar de forma desnecessária na condução da lavoura”, esclarece. Divulgação e sensibilização Uma das ações de divulgação da produção integrada de pimentão ocorreu no segundo semestre do ano passado, na Festa do Pimentão em Itápolis (SP), onde há cerca de dez anos a hortaliça foi inserida em substituição à citricultura. “O ganho é decorrente daquilo que o produtor deixou de gastar de forma desnecessária” O agrônomo Sílvio Carlos dos Santos, da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) do estado de São Paulo, foi um dos pioneiros no incentivo ao cultivo de pimentão na região, que hoje contempla 15 municípios que produzem cerca de 2 milhões de caixas da hortaliça em 1,2 mil estufas. Ele também é um entusiasta da produção integrada e vem desenvolvendo esse trabalho de disseminação da PIP, visando a obtenção do selo de qualidade e a rastreabilidade para os produtores da região. Santos afirma que alguns agricultores estão tendo bons resultados com a adoção do controle biológico, que é uma das boas práticas recomendadas pela PI. “Estamos conseguindo redução de até 50% de aplicação de insumos químicos. O produtor tem receio de alterar o que vem fazendo há anos. Por isso, estamos indo devagar”, conta o agrônomo, que vai incentivar os produtores a fazerem monitoramento de pragas e doenças. Sistemas com certificação nacional Em âmbito nacional, os sistemas de produção integrada e de produção orgânica são os únicos passíveis de obtenção de certificação reconhecida pelo Ministério da Agricultura. Nos dois casos, é preconizado o uso das boas práticas agrícolas, ambientais e trabalhistas pré-determinadas na condução da cultura. Na produção orgânica, são proibidas aplicações de agrotóxicos e fertilizantes químicos. Na produção integrada, o uso de produtos químicos é permitido, dentro de limites determinados que não interfiram na sanidade do alimento, na saúde do produtor e no meio ambiente. A grande maioria dos produtores da região de Itápolis é formada por agricultores de base familiar. É o caso de Devanir de Oliveira, de 46 anos. Na chácara de três alqueires onde mantém uma lavoura diversificada, ele instalou uma estufa para produção de pimentões vermelho e amarelo. A expectativa é conseguir colher na primeira safra, que teve início em abril, 3 mil caixas de pimentão nobre. Com a ajuda da filha Rafaela, ele está seguindo as orientações repassadas pelo técnico da Cati sobre uso de produtos para o controle de pragas e doenças, baseadas na realização do monitoramento de pragas. “Nós utilizamos principalmente os biológicos, mas intercalamos com químicos quando a praga se mostra mais forte”, conta Rafaela, acrescentando que os pés de pimentão estão bem carregados. O agricultor diz que não está tendo dificuldades em seguir as orientações. “Alguns produtos precisam ficar na geladeira. É um pouco trabalhoso, mas a gente precisa se preocupar com a saúde e também cuidar do meio ambiente para os nossos filhos”, conta Devanir, que cita a exigência da rastreabilidade como mais um motivo para adotar as boas práticas na lavoura.
O monitoramento de pragas e doenças durante o manejo da cultura do pimentão é capaz de reduzir em torno de 30% a aplicação de produtos químicos na lavoura. A constatação é do entomologista Jorge Anderson Guimarães, responsável pelas pesquisas relacionadas à produção integrada na Embrapa Hortaliças (DF). A prática é um dos procedimentos recomendados pela produção integrada do pimentão (PIP) (veja quadro abaixo) e proporcionou a economia ao ser associada a outras medidas como o controle biológico de pragas.
“Além de diminuir os custos com o uso dos insumos, essas práticas atendem a outra preocupação desse sistema de cultivo: assegurar a saúde do produtor”, explica o pesquisador, acrescentando que o agricultor geralmente opta pela aplicação pré-definida de produtos químicos, conhecida como “calendários de aplicação”. De acordo com Guimarães, essa prática, que não se resume ao pimentão, tem como consequência o uso desnecessário de produtos químicos, algumas vezes não registrados para a cultura.
“Basicamente, esses dois procedimentos que vieram à tona nos relatórios do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) podem ser corrigidos com a adoção da produção integrada, uma vez que ela disciplina o uso de produtos químicos, restringindo a utilização àqueles recomendados e registrados”, explica o pesquisador.
Alta Qualidade Frutos padronizados, sadios e com garantia de procedência e certificação. O passo a passo para que o pimentão de alta qualidade seja regra e não exceção no mercado brasileiro está contemplado na Instrução Normativa nº 40 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) - Norma Técnica Específica (NTE), que regulamenta a Produção Integrada do Pimentão (PIP), publicada no segundo semestre do ano passado. |
No último relatório do PARA, referente ao período 2013/2015, foram analisadas em todo território nacional 243 amostras de pimentão, sendo que 214 delas apresentavam resíduos de agrotóxicos não autorizados para a cultura. Dessas, 21 foram consideradas insatisfatórias exclusivamente por conter resíduos não autorizados, mesmo em concentrações inferiores a 0,001 mg/kg.
A gerente de Monitoramento e Avaliação do Risco da Gerência-Geral de Toxicologia da Anvisa, Adriana Pottier, reforça que alimentos resultantes de cadeias produtivas mais organizadas têm apresentado melhores resultados nos relatórios do PARA.
Adriana lembra que quando foram realizados os primeiros relatórios existiam poucos agrotóxicos registrados para a cultura, ressaltando que os índices são relacionados a parâmetros agronômicos. Ela reforça que a Anvisa recomenda ao consumidor escolher alimentos da estação e que apresentem informações de origem. Outra orientação é redobrar os cuidados com a higienização dos produtos em casa.
Origem da solução
O pimentão está entre as quatro hortaliças mais sensíveis a pragas e doenças, com o agravante de existirem poucos produtos químicos registrados especificamente para a cultura. As consequências dessas duas questões se refletiram nos relatórios do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos da Anvisa, divulgados a partir de 2010. Os resultados apresentaram amostras de pimentão com altos índices de contaminação em virtude do uso de produtos químicos não registrados para a cultura e com limites de resíduos acima dos permitidos pela legislação.
Esses resultados impulsionaram a demanda do ministério para que fosse elaborada a PIP, no início de 2013, com a assinatura do Termo de Execução Descentralizado (TED) entre o ministério e a Embrapa Hortaliças. Com a missão de estabelecer as boas práticas para essa cultura - que em 2017 ocupava uma área de 11.188 hectares em todo o Brasil e com produção de 555 mil toneladas -, pesquisadores da Embrapa Hortaliças (DF), com o apoio de técnicos da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF) e de agricultores, identificaram os principais problemas enfrentados pelos produtores do Núcleo Rural de Taquara – maior produtor de pimentão do Distrito Federal.
Os dados coletados em visitas e reuniões subsidiaram a elaboração de um conjunto de boas práticas agrícolas para a PIP, que estão contempladas em 12 publicações e relacionadas no documento “Normas Técnicas e Documentos de Acompanhamento da Produção Integrada do Pimentão”, editado pela Embrapa Hortaliças. As diretrizes sobre o processo de adoção da produção integrada do pimentão também constam na publicação.
Passo a passo para cumprir a produção integrada
A Norma Técnica Específica da PIP contempla 18 áreas, nas quais estão definidos os requisitos obrigatórios, recomendados e proibidos para cada etapa do sistema de produção integrada. Para viabilizar esse sistema de produção, no qual se pode obter a certificação do produto com o selo “Brasil Certificado”, a NTE da PIP exige a aplicação de boas práticas agrícolas durante todas as fases de cultivo, colheita e pós-colheita.
Essas boas práticas foram elaboradas por pesquisadores da Embrapa Hortaliças em parceria com a Emater-DF e outros parceiros. O documento orienta os produtores sobre os procedimentos que devem ser tomados com relação a vários processos, como irrigação, nutrição e manejo do solo, monitoramento e manejo de pragas e doenças, orientações para a aplicação de agrotóxicos, manuseio dos frutos na pós-colheita e coleta de amostras para análises de resíduos. “Essas práticas possibilitam o manejo adequado desde a etapa de cultivo até a disponibilidade do alimento para a comercialização”, observa o pesquisador, enfatizando que qualquer agricultor pode implementar as boas práticas, independentemente da adesão à produção integrada.
Todas as ações realizadas na condução da lavoura devem ser registradas em “cadernos de campo”. São essas anotações que vão possibilitar ao produtor atender às categorias “Registro de informações” e “Rastreabilidade”. Elas são exigidas no momento da etapa de fiscalização, que é realizada por meio de empresas credenciadas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) para a avaliação da conformidade e obtenção da certificação.
A produção integrada no Brasil A Produção Integrada Agropecuária (PI-Brasil) contempla atualmente a cerca de 30 culturas, especialmente frutíferas para exportação, mas há também hortaliças, grãos, flores, plantas ornamentais, tabaco e produtos de origem pecuária. No Brasil, a PI passou a ser adotada em 2001 pela cadeia de frutas, seguindo os moldes do sistema que surgiu na Europa no fim da década de 1970. |
O agrônomo da Emater-DF Fabiano Carvalho foi um dos técnicos que contribuiu para a definição da classificação (obrigatório, recomendado, proibido) dos procedimentos que constam na Norma Técnica. Ele considera a produção integrada viável e relata que, pela sua experiência, as adequações que precisam ser efetivadas pelo agricultor estão relacionadas mais a procedimentos do que a investimento financeiro. “Percebemos que os produtores melhoram os processos de gestão e passam a conhecer a sua produção ao adotar medidas simples como o registro das decisões tomadas durante o cultivo”, enfatiza Carvalho.
O técnico da Emater Carlos Banci, envolvido nas discussões sobre a elaboração do sistema de produção integrada, reforça que aqueles que buscam seguir as recomendações, principalmente, relacionadas às ações gerenciais, estão tendo resultados melhores que a média dos agricultores.
Próximos passos
Com a publicação da norma técnica específica e a disponibilização das boas práticas, os especialistas planejam a implantação de unidades demonstrativas em propriedades rurais.
A fase posterior envolve treinamentos de técnicos e de produtores interessados em adotar o sistema de produção integrada. “É um processo que demanda tempo entre a adoção e a implementação de todos os itens listados na NTE até alcançarmos a etapa final de auditoria das propriedades por certificadoras acreditadas pelo Inmetro e a obtenção do selo”, reconhece o pesquisador da Embrapa.
“O hábito do brasileiro de apalpar os frutos e selecionar os melhores ocorre porque não existe essa padronização” |
Cenário favorável para a PI no Brasil
O pesquisador Jorge Guimarães acredita que esse sistema deve se beneficiar da publicação de duas instruções normativas sobre rastreabilidade e oferta de alimentos padronizados e de qualidade para comercialização, publicadas no ano passado. Os procedimentos que possibilitam a rastreabilidade ao longo da cadeia produtiva de produtos vegetais frescos, para fins de monitoramento e controle de resíduos de agrotóxicos, consta na Instrução Normativa Conjunta nº 02/2018, do ministério e da Anvisa. “Essa medida vem ao encontro do que preconiza a PI, ao exigir do produtor o registro dos dados desde as fases de plantio até a pós-colheita. Ela tende a beneficiar também os produtores, uma vez que possibilita identificar a origem do problema em casos de irregularidades”, enfatiza.
O especialista acrescenta que a IN nº 69/2018 também está alinhada ao resultado final do que propõe a produção integrada, que é oferecer produtos de alta qualidade. A medida prevê que mais de 50 produtos hortícolas comercializados no varejo ou no atacado tenham requisitos mínimos de qualidade, como padronização e estágios iguais de maturação. Para ele, o hábito do brasileiro de apalpar os frutos e selecionar os melhores ocorre porque não existe essa padronização. “Essas normativas permitirão o estabelecimento dos pilares para o avanço da produção integrada do pimentão, assim como de outras culturas no Brasil”, frisa.
Sistema de cultivo exige produtores com perfil diferenciado
O pesquisador Jorge Guimarães ressalta que a adesão à produção integrada é voluntária e requer agricultores com perfil diferenciado, comprometidos com a oferta de produtos de qualidade superior, considerando a sustentabilidade da produção e do meio ambiente. Os interessados devem se adequar às normas da PI e, entre outros compromissos, assinar contrato com empresa certificadora, registrar as atividades desenvolvidas na área de produção e fornecer amostras para análises de resíduos.
Para o especialista, a produção integrada requer uma mudança de mentalidade ao considerar que o retorno financeiro não está propriamente no valor de venda do produto, e sim na melhoria da gestão da propriedade e na economia obtida com a realização das boas práticas. “A PI pressupõe mecanismos de monitoramento, análise de solos e de outros itens para avaliar a necessidade real do uso de insumos. O ganho na PI é decorrente, muitas vezes, do que o produtor deixou de gastar de forma desnecessária na condução da lavoura”, esclarece.
Divulgação e sensibilização
Uma das ações de divulgação da produção integrada de pimentão ocorreu no segundo semestre do ano passado, na Festa do Pimentão em Itápolis (SP), onde há cerca de dez anos a hortaliça foi inserida em substituição à citricultura.
“O ganho é decorrente daquilo que o produtor deixou de gastar de forma desnecessária” |
O agrônomo Sílvio Carlos dos Santos, da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) do estado de São Paulo, foi um dos pioneiros no incentivo ao cultivo de pimentão na região, que hoje contempla 15 municípios que produzem cerca de 2 milhões de caixas da hortaliça em 1,2 mil estufas. Ele também é um entusiasta da produção integrada e vem desenvolvendo esse trabalho de disseminação da PIP, visando a obtenção do selo de qualidade e a rastreabilidade para os produtores da região.
Santos afirma que alguns agricultores estão tendo bons resultados com a adoção do controle biológico, que é uma das boas práticas recomendadas pela PI. “Estamos conseguindo redução de até 50% de aplicação de insumos químicos. O produtor tem receio de alterar o que vem fazendo há anos. Por isso, estamos indo devagar”, conta o agrônomo, que vai incentivar os produtores a fazerem monitoramento de pragas e doenças.
Sistemas com certificação nacional Em âmbito nacional, os sistemas de produção integrada e de produção orgânica são os únicos passíveis de obtenção de certificação reconhecida pelo Ministério da Agricultura. Nos dois casos, é preconizado o uso das boas práticas agrícolas, ambientais e trabalhistas pré-determinadas na condução da cultura. Na produção orgânica, são proibidas aplicações de agrotóxicos e fertilizantes químicos. Na produção integrada, o uso de produtos químicos é permitido, dentro de limites determinados que não interfiram na sanidade do alimento, na saúde do produtor e no meio ambiente. |
A grande maioria dos produtores da região de Itápolis é formada por agricultores de base familiar. É o caso de Devanir de Oliveira, de 46 anos. Na chácara de três alqueires onde mantém uma lavoura diversificada, ele instalou uma estufa para produção de pimentões vermelho e amarelo. A expectativa é conseguir colher na primeira safra, que teve início em abril, 3 mil caixas de pimentão nobre. Com a ajuda da filha Rafaela, ele está seguindo as orientações repassadas pelo técnico da Cati sobre uso de produtos para o controle de pragas e doenças, baseadas na realização do monitoramento de pragas. “Nós utilizamos principalmente os biológicos, mas intercalamos com químicos quando a praga se mostra mais forte”, conta Rafaela, acrescentando que os pés de pimentão estão bem carregados. O agricultor diz que não está tendo dificuldades em seguir as orientações. “Alguns produtos precisam ficar na geladeira. É um pouco trabalhoso, mas a gente precisa se preocupar com a saúde e também cuidar do meio ambiente para os nossos filhos”, conta Devanir, que cita a exigência da rastreabilidade como mais um motivo para adotar as boas práticas na lavoura.