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09/12/16 |   Produção animal  ILPF  Agricultura de Baixo Carbono

Sistemas integrados promovem balanço de carbono positivo

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Foto: Fabiano Bastos

Fabiano Bastos -

Uma das primeiras conclusões encontradas pelos pesquisadores da Rede Pecus focados no bioma Cerrado diz respeito ao potencial dos sistemas integração lavoura-pecuária (ILP) e integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) de sequestrar carbono. As perspectivas indicam um balanço de carbono positivo de 1,3 e 23,0 t CO2eq./ha/ano, respectivamente, enquanto a pastagem com baixa produtividade apresenta um balanço negativo de 0,4 t CO2eq./ha/ano.  Os pesquisadores Roberto Guimarães Júnior, Karina Pulrolnik, Robélio Marchão, Lourival Vilela, Giovana Maciel, Kleberson Worslley e Luiz Gustavo Pereira, da Embrapa Cerrados, observaram ainda que esse excedente de carbono nos mesmos sistemas pode neutralizar a emissão de metano entérico do gado.

Os modelos instalados pela Embrapa Cerrados foram semelhantes aos testados pela Embrapa Gado de Corte, Embrapa Agropecuária Oeste e Embrapa Arroz e Feijão, em áreas de Cerrado e transição Cerrado-Amazônia. As avaliações das emissões foram em cultivos de grãos (soja, milho safrinha, sorgo e arroz de terras altas), por uma ou duas safras (verão e safrinha), e pasto, braquiária, por três a quatro anos, além de espécies de eucaliptos de múltiplo uso, aptas para a indústria de celulose e madeireira, e animais da raça Nelore. "A ideia foi chegar o mais próximo da realidade do produtor. Seja um iniciante em sistemas integrados ou mais experiente; seja um agricultor que partiu para a pecuária ou um pecuarista que incorporou a agricultura", assegura Roberto Giolo de Almeida, coordenador das pesquisas no bioma.

Refinamento de dados 
Nos estudos em ILP, introduziram-se inovações na caracterização de fluxos de gases de efeito estufa (GEE) do solo para a atmosfera. No Brasil, empregam-se normalmente câmaras estáticas manuais para fazer esse tipo de medição. No caso das pesquisas em questão, foi adotado um método, o de fluxo-gradiente, que, ao empregar um equipamento analisador de gases, quantifica as concentrações desses gases em uma amostra de ar. De acordo com a pesquisadora da Embrapa Beata Emoke Madari, especialista em Ciência do Solo, as câmaras estáticas permitem obter, na maioria dos casos, apenas uma amostragem por dia com um limitado número de câmaras, ou seja, há baixa representatividade espaço-temporal para se apurar a dinâmica e quantificar as emissões dos GEE de uma área de produção.

O aprimoramento do trabalho veio em combinar os dados gerados pelas câmaras estáticas com os métodos micrometeorológicos, dentre eles o de fluxo-gradiente. O objetivo foi  uma informação mais próxima da realidade, monitorando as emissões de GEEs a cada minuto, por 24 horas, para áreas que podem abranger hectares. Isso é importante nos estudos de sistemas de produção, em que as parcelas avaliadas são grandes e heterogêneas, o que dificulta a amostragem representativa com câmaras estáticas.  "Assim, atualmente, medimos os fluxos de óxido nitroso e dióxido de carbono como informação adicional e complementar às avaliações feitas com câmaras estáticas."

Outra vantagem, ainda segundo Madari, é que esses métodos permitem o monitoramento dos gases emitidos para a atmosfera pelo solo e pela vegetação e os gases retirados da atmosfera, principalmente pela vegetação, dentro do sistema de produção de forma simultânea. "Com isso, podemos ter informação sobre o balanço de carbono total do sistema", afirma.

Ganho ao incorporar floresta
Os benefícios das árvores, neste caso os eucaliptos, justificam-se por ampliar o potencial de remover gás carbônico (CO2) da atmosfera e proporcionar maior conforto térmico ao gado. O pesquisador André Dominghetti Ferreira, da Embrapa Gado de Corte, explica que "uma maior densidade de árvores proporciona maior fixação de carbono e, portanto, maior será a mitigação dos gases de efeito estufa produzidos pelo gado". Ele demonstra que, no arranjo espacial de eucaliptos de 14 m (espaçamento entre fileiras) x 2 m (entre árvores), o carbono fixado aos 86 meses após o plantio das árvores foi suficiente para neutralizar as emissões de 12,7 animais/hectare/ano (450 kg/peso vivo). Esses resultados embasaram o conceito da Carne Carbono Neutro, produzida em sistemas pecuários com a presença de árvores, que neutralizam as emissões de metano do gado.

Já ao incorporar forrageiras tropicais, há maior volume de matéria orgânica do solo (MOS), pelas características radiculares dessas espécies, e maior estoque de carbono. Nos sistemas de integração, o solo foi avaliado em até 20 cm de profundidade, havendo um acúmulo, entre 2008 e 2015, de 20,1% em integração lavoura-pecuária e 26,2%, em integração lavoura-pecuária-floresta. Conforme Roberto Giolo, em solos pobres, como os do Cerrado, antigos e profundos, carbono estocado é lucro, e a MOS entra como a chave para a agricultura nos trópicos pela melhora na fertilidade, na estrutura do solo e, nesse contexto, no sequestro de carbono.

Madari reforça que a combinação das atividades no meio rural (ILP e ILPF) é um passo em busca de maior sustentabilidade por meio do sequestro de carbono pelo solo e do balanço favorável de menor emissão de GEE por parte do sistema de produção como um todo. "O potencial de acumulação líquida positiva de carbono em ILP e ILPF e a capacidade da ILPF para acumular carbono no solo são argumentos complementares que apoiam o pressuposto de que sistemas integrados são uma opção para uma agropecuária mais sustentável e de baixa emissão de carbono, quando comparada aos sistemas agropecuários convencionais".

Em termos de produção animal, os cientistas verificaram após três anos de pastejo em Campo Grande (MS) que os sistemas ILP e ILPF proporcionaram um ganho de peso vivo de 537 kg/ha (ILP) e 459 em ILPF, com taxa de lotação de 1,51 e 1,33 unidade animal por hectare (UA/ha), respectivamente. A menor produção animal no ILPF é resultado do sombreamento causado pelas árvores, entretanto, os benefícios ambientais, principalmente com relação ao bem-estar animal e à mitigação de gases de efeito estufa, são maiores neste sistema, além da vantagem da diversificação da produção.

Relação entre dejetos de bovinos e GEEs
As excretas dos animais (fezes e urina) sob pastejo são avaliadas em diferentes partes do mundo para quantificar sua contribuição na emissão de GEE e, em Dourados (MS), entre 2012 e 2014, a pesquisadora Michely Tomazi, da Embrapa Agropecuária Oeste, avaliou a emissão em sistemas de pastagem permanente e ILP. Os dados gerados mostraram que do total de carbono equivalente (Ceq) emitido pelas excretas, de 27% a 38% é devido ao metano (CH4) emitido de fezes, e de 62% a 73% é devido ao óxido nitroso (N2O) emitido pela urina. No caso do nitrogênio aplicado na forma de urina, o fator de emissão de óxido nitroso ficou de quatro a sete vezes abaixo do limite de 2% estabelecido pelo IPCC.

"Os resultados obtidos nesta pesquisa são pioneiros e poderão contribuir muito para melhorar os índices de emissão de GEE nos próximos inventários nacionais. É um grande diferencial para a produção nas condições de solo e clima do bioma Cerrado", afirma Tomazi. Segundo ela, os fatores que influenciam a emissão são principalmente clima e tipo de solo. "Por isso, a necessidade de  obter os valores do Brasil para serem utilizados nos inventários nacionais. Como ainda utilizamos dados de outros países, os valores do balanço de carbono dos nossos sistemas ficam muito elevados, colocando a pecuária brasileira como um problema para emissão de GEE, o que não condiz com a realidade, como mostram os resultados", pondera.

Para Beata Madari, pesquisadora na Rede Pecus e coordenadora da Rede Fluxus, que avalia a emissão de GEE e balanço de carbono em sistemas de produção de grãos no Brasil, todo esse trabalho de pesquisa supera, gradativamente, a falta de informações científicas acerca da agropecuária com baixa emissão de carbono no Cerrado e em zonas de transição. Ela ressalta que, com o avanço do conhecimento, será possível, por exemplo, melhor subsidiar a tomada de decisões governamentais  em ações como o Programa de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono, bem como ajudar na formação de políticas públicas futuras e abastecer a base de dados do Painel Brasileiro sobre Mudança do Clima e Painel Intergovernamental da ONU (IPCC).

Carbono Neutro para produção bovina

Carnes bovinas frescas, congeladas ou transformadas, para mercado interno ou exportação, poderão receber um selo certificando a sustentabilidade ambiental de sua produção. A Embrapa lançou em junho de 2016 a marca Carne Carbono Neutro (CCN), registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com a finalidade de atestar a produção de bovinos de corte em sistemas com a introdução obrigatória de árvores como diferencial.  A certificação ainda dependerá de negociações com os setores público e privado para a sua implantação e posterior transformação em selo.

A presença do componente arbóreo em sistemas de integração do tipo silvipastoril (pecuária-floresta, IPF) ou agrossilvipastoril (lavoura-pecuária-floresta, ILPF) neu­traliza o metano entérico exalado pelos animais, um dos principais gases responsáveis pelo efeito estufa. Para garantir que a produção esteja de acordo com o conceito CCN, devem ser seguidas as orientações no documento Carne Carbono Neutro: um novo conceito para carne sustentável produzida nos trópicos.

Refúgio de espécies

Reconhecido como a savana mais rica do mundo, considerada sua diversidade biológica, o Cerrado brasileiro, de acordo com o Ministério do Meio Ambiente, abriga 11.627 espécies de plantas nativas já catalogadas. Muitas têm potencial para uso medicinal. Outras podem ser usadas na recuperação de solos degradados, como barreiras contra o vento, proteção contra a erosão, ou para criar habitat de predadores naturais de pragas. Mais de dez tipos de frutos comestíveis são consumidos pela população local e vendidos nos centros urbanos, a exemplo dos frutos da cagaita (Eugenia dysenterica), bacupari (Salacia crassifolia), do cajuzinho-do-cerrado (Anacardium humile) e do araticum (Annona crassifolia) e das sementes do baru (Dipteryx alata).

Cerca de 199 espécies de mamíferos são conhecidas, e o rico conjunto de aves do bioma compreende cerca de 837 espécies. Os números de peixes (1.200 espécies), répteis (180 espécies) e anfíbios (150 espécies) são elevados. Estimativas apontam ainda o Cerrado como  refúgio de 13% das borboletas, 35% das abelhas e 23% dos cupins dos trópicos. Cerca de 137 espécies de animais que ocorrem no Cerrado estão ameaçadas de extinção. No entanto, depois da Mata Atlântica, o Cerrado é o bioma brasileiro que mais sofreu alterações com a ocupação humana.

É o segundo maior bioma da América do Sul, ocupando uma área de 2.036.448 km2, cerca de 22% do território nacional. Sua área contínua incide sobre os estados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Rondônia, Paraná, São Paulo e Distrito Federal, além dos encraves no Amapá, Roraima e Amazonas. Neste espaço territorial, encontram-se as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul (Amazônica/Tocantins, São Francisco e Prata), o que resulta em um elevado potencial aquífero e favorece a sua biodiversidade.

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Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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