15/07/15 |   Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação

Crescer com respeito ao planeta

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Foto: Arte: Gabriel Nogueira

Arte: Gabriel Nogueira -

Agricultura pode aumentar sua produção protegendo o meio ambiente, essa é a proposta da intensificação sustentável

Há 200 mil anos sobre a Terra, a espécie humana sempre se beneficiou da abundância de recursos. Dos nossos ancestrais habitantes das cavernas aos atuais moradores das metrópoles, conseguimos até hoje produzir mais do que precisamos. Mas até quando será assim? Um forte sinal de que os dias de fartura estariam contados surgiu no século XVIII. Em 1798, um pastor anglicano percebeu que o aumento da produção de alimentos era muito mais lento que o crescimento populacional. Com os dados observados na época, ele fez uma projeção básica da evolução "número de pessoas versus produção de comida" e previu que as duas curvas haveriam de se cruzar em algum ponto a partir do qual a fome seria inevitável para boa parte da humanidade. Os resultados foram publicados na obra "Ensaio sobre o princípio da população", escrito pelo economista e pastor britânico Thomas Malthus. A demografia ganhava um clássico e o mundo, uma preocupação latente.

Malthus não viveria o suficiente para averiguar que sua previsão não se realizaria tão cedo. Em especial, porque ele não havia considerado variáveis-chave como os avanços científicos e tecnológicos que permitiram acelerar a produção de alimentos. No entanto, é certo que há um limite e estamos nos aproximando dele. Diferentemente da população em franco crescimento, as terras aráveis, recursos e insumos são finitos.

Há de se ter em mente ainda que, no campo, os alimentos dividem espaço com a produção de madeira que mobília nossas casas, biocombustível que alivia a demanda por petróleo, e também fibras que compõem a roupa que você está usando ou o papel desta revista, só para citar poucos exemplos. Para complicar a equação, a ação humana modificou o planeta e seu clima, o que vem trazendo mais um desafio à atividade agrícola.

Esse panorama de adversidades acabou motivando o surgimento de um novo conceito de produção agropecuária formado por dois pilares. Primeiro, é preciso obter o máximo que a terra pode nos oferecer. Por que depender de uma monocultura de soja, por exemplo, se podemos gerar na mesma área produtos diversos como carne, madeira, milho e sorgo, além da própria soja? A diversificação não só aumenta a capacidade de produção como também dá mais segurança financeira ao produtor que deixa de depender de um único produto.

Produzir mais é importante, mas não é tudo. O aumento da produção deve ser acompanhado da garantia de que o meio ambiente manterá suas condições de prover necessidades humanas, permanecer com parcelas naturais preservadas e ainda auxiliar na mitigação dos efeitos da ação humana no clima do planeta. O que resume o segundo eixo do conceito: sustentabilidade.

A reunião das duas filosofias cunhou o termo "intensificação sustentável" que envolve práticas conservacionistas, integração de diferentes sistemas produtivos numa mesma área, noções que envolvem ciências agrárias e ambientais e maior interdisciplinaridade aos estudos agronômicos. "Antes era estranho você pensar em um pasto ou plantação com árvores no meio, hoje a coisa mudou," conta o pesquisador Vanderley Porfírio da Silva, da Embrapa Florestas (PR), que lembra dos primórdios do desenvolvimento dos sistemas integrados (veja texto "Uma semente de mais de duas décadas").

Um dos maiores impulsionadores da intensificação sustentável é o papel da agropecuária na mitigação dos efeitos provocados pelos gases de efeito estufa (GEE). "O setor tem a capacidade de neutralizar ou imobilizar esses gases," explica Eduardo Assad, pesquisador da Embrapa Informática Agropecuária (SP). No entanto, para isso é preciso, segundo ele, encontrar o equilíbrio entre produção e sustentabilidade. "É possível criar 30 bois por hectare por ano, contudo, para neutralizar os gases emitidos por eles, teremos no máximo entre um e 1,5 animal por hectare por ano", exemplifica o especialista.

A ideia principal nesse caso é neutralizar os GEEs emitidos por bovinos, especialmente o metano (CH4) eliminado por ruminantes por eructação, o nome técnico para "arroto". Assad conta que a pecuária brasileira tem sido alvo de críticas internacionais, segundo as quais o setor é nocivo ao ambiente ao jogar na atmosfera enormes quantidades de metano. Para ele, a tendência é que a pressão internacional aumente cada vez mais a ponto de se transformar em barreiras não tarifárias que o País terá de enfrentar. "A carne brasileira terá de certificar sua procedência e atestar que foi produzida em condições que respeitaram o meio ambiente", prevê o pesquisador. Uma resposta ao problema seria integrar a pecuária à lavoura, à silvicultura (árvores plantadas) ou a ambos na chamada integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).

Além do acesso ao mercado internacional, o que o produtor ganharia com isso? Muito, de acordo com Assad. "Primeiro, ele diversifica a produção e ganha com outros produtos além da carne, depois, ele poderá receber por serviços ambientais ou ainda vender créditos no mercado de carbono," esclarece. Os serviços ambientais são pagos por programas governamentais a produtores que adotam práticas conservacionistas específicas. Um exemplo é o Programa Reflorestar, do Estado do Espírito Santo, o qual remunera fazendeiros que recuperam áreas de vegetação nativa. O Programa Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (ABC), coordenado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) também atua no mesmo sentido. Além de oferecer créditos a juros menores, o ABC permite o uso de até 35% do valor financiado para a recomposição de áreas de preservação permanente ou reserva legal (saiba mais sobre o programa ABC).

Produção de água
Para os governos também é interessante, segundo Assad. A recuperação de áreas naturais abre um novo nicho de mercado: a produção de mudas de plantas nativas. Além disso, as práticas conservacionistas também mitigam outro problema crucial, a crise hídrica. "Uma grande vantagem é que a água volta a aparecer. Prevenindo erosão, preservando solos, rios e lagos e facilitando a infiltração de água no solo, essas práticas promovem a recarga de lençóis e aumentam o volume de água disponível," afirma.
Os sistemas integrados permitem aumentar a capacidade de suporte do campo, que é o número máximo de animais que uma área consegue manter de maneira sustentável. Um pasto simples, sem integração, é capaz de receber até 0,4 animal por hectare/ano para neutralizar os gases emitidos. Se o pasto for integrado a uma produção agrícola, o número sobe para 1,5 animal/ha/ano e se a integração envolver florestas plantadas, o produtor poderá manter até 2,5 animais/ha/ano sem perigo de emitir GEEs em excesso. "As árvores têm grande capacidade para neutralizar e fixar carbono no solo e em sua biomassa aérea, o que permite aumentar a capacidade de suporte ao reduzir o efeito estufa," conta Assad. De quebra, as árvores proporcionam sombra no pasto dando conforto térmico aos animais e aumentando a produtividade. "A diferença das áreas ensolaradas para as regiões de sombra pode chegar a 10ºC", afirma o pesquisador frisando que esse conforto faz diferença na produção.

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Fabio Reynol
Secretaria de Comunicação da Embrapa - Secom

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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