15/07/15 |   Florestas e silvicultura

Florestas no campo

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Foto: Gabriel Rezende Faria

Gabriel Rezende Faria -

Como as árvores melhoram a produção

Há oito anos, quando plantar árvores na pastagem parecia uma ideia fora de propósito, o Condomínio Pizzolato, em Saudade do Iguaçu, região sudoeste do Paraná, converteu 10,2 hectares de pastagem em sistema silvipastoril, uma das tecnologias de ILPF, associando gado leiteiro da raça Jersey com pastagem de tifton (Cynodon spp.)  e árvores da espécie Grevilea robusta. O condomínio é formado pelas propriedades de quatro famílias de pequenos agricultores que investiram em organização e tecnologia para o sucesso da proposta.

Em pouco tempo, vieram os resultados: a arborização do pasto contribuiu para o aumento da produtividade do rebanho, em especial pelo conforto térmico proporcionado aos animais, e promoveu a conservação do solo, com influência na qualidade da pastagem. O condomínio tornou-se uma Unidade de Referência Tecnológica (URT) da Embrapa em parceria com o Instituto Emater Paraná e o Instituto Agronômico do Paraná (Iapar).

O produtor rural Eugênio Pizzolatto conta que, quando o condomínio começou a criar o gado leiteiro, reparou que os animais sofriam muito com o calor. "A Embrapa e a Emater fizeram a proposta para fazer o experimento em sistema de integração. Nós abraçamos essa causa e só estamos tendo sucesso. O conforto térmico para os animais aumentou a produção de leite. O animal agradece!", comemora, lembrando que, no início, produtores rurais vizinhos viam com desconfiança a tecnologia. Hoje, o condomínio é referência para toda a região e realiza dias de campo para mostrar as diversas fases e técnicas utilizadas. O motivo do sucesso? "Buscar informação para não errar. O acompanhamento técnico é fundamental. E não fazer negócio sem fazer conta, sem planejar", ensina o produtor.

Em 2014 foi realizado o primeiro desbaste, que é o corte seletivo das árvores com desenvolvimento inferior às demais. O objetivo é diminuir a competição entre árvores e permitir que as remanescentes continuem crescendo para produzir boa madeira e bom rendimento de tora, além de regular o sombreamento para permitir o crescimento da pastagem.

O médico-veterinário e extensionista do Instituto Emater Paraná José Antônio Vieira acompanha o condomínio desde a implantação do sistema e atesta os benefícios da tecnologia. "Em momentos quentes, o gado encontra um microclima bastante fresco, saudável. E, no inverno, um microclima de 4 a 5 graus a mais. A presença das árvores na pastagem também ajuda a evitar chuva, geada, eventos extremos ao gado e à pastagem. Em períodos secos, ajuda a reter umidade necessária para o desenvolvimento das gramíneas".

Os primeiros dados analisados do condomínio indicam um aumento de 20% no volume de leite produzido. Já em relação à grevílea, as árvores do primeiro desbaste podem ser utilizadas para produção de madeira fina, como cabos e sarrafos. Nos 10,2 ha foram plantadas 2.200 árvores e, no primeiro desbaste, foram retiradas 710 árvores, o que representou a colheita de aproximadamente 110 m3 de madeira. Esse volume já gerou renda suficiente aos produtores para a compra de uma serraria móvel. Restam, ainda, 776 árvores que, se retiradas hoje, representariam um volume de 237 m3. A expectativa é que essas árvores fiquem no sistema pelo menos mais quatro ou cinco anos, possibilitando o incremento em volume de madeira, além de proporcionar um produto com maior valor no mercado, uma vez que o tipo de madeira produzido pode ser comercializado para serrarias (movelaria e esquadrias).

A ciência florestal
Por trás dos resultados existe muita pesquisa. No sistema de integração, a árvore é um componente de produção, por isso precisam ser utilizadas espécies com material genético conhecidamente produtivo e adaptado à região. Além disso, a integração deve ser muito bem-planejada, pois muitas vezes só é possível descobrir algum problema depois que as árvores já estão com entre três e quatro anos, o que pode representar um grande prejuízo.

Embora várias espécies florestais sejam utilizadas, as mais plantadas hoje no País para ILPF são os eucaliptos. Aos poucos, a grevílea também começa a ganhar espaço. A orientação é também pela escolha de espécies que tenham mercado na região onde estão plantadas, uma vez que o transporte é um item de alto custo em operações florestais. 

No entanto, ainda são poucas as informações sobre como essas espécies se comportam em sistemas de integração. "Existem diferenças importantes", explica o pesquisador Vanderley Porfírio da Silva, da Embrapa Florestas. "As principais características das árvores sofrem alterações dependendo do tipo de espaçamento e das condições de plantio. Quando as árvores são plantadas em maciços florestais, com espaçamentos mais apertados, se comportam de uma maneira. Já o espaçamento e as condições em sistemas de integração são bem diferentes e modificam relações como, por exemplo, grossura de galho, espessura de anel de crescimento, altura média, diâmetro, entre outros", completa.
Uma árvore em monocultura tende a desramar (perder os galhos) naturalmente com mais facilidade, mas quando vai para um sistema de integração isso já não acontece. Com mais espaço para crescer, os ramos ficam vivos por mais tempo e não sofrem a desrama natural da forma esperada. Existe, portanto, um grande espaço de pesquisa, em especial para o melhoramento genético e manejo, que pode, entre outros, também oferecer opções de novas espécies para sistemas de integração.

A pesquisa florestal, no entanto, enfrenta um desafio peculiar: a extensão de tempo para obtenção de respostas. "O tempo de pesquisa de lavoura ou forrageiras, que têm ciclos de vida anuais, por exemplo, é bem menor que o da investigação de uma espécie arbórea, que tem ciclo de vida de décadas", compara Porfírio.

A junção de temas tão distintos dentro de um mesmo espaço é a grande inovação proporcionada pela ILPF. Antes, a propriedade rural era vista como algo compartimentado, em que cada pedaço de terra era destinado a um tipo de atividade. A ILPF trouxe uma visão de integração que tem se disseminado nos dias de hoje. "Isso exige capacidade de gerenciar esses componentes, entender as necessidades de cada um, pois os recursos, como água e luz, por exemplo, são compartilhados", explica Porfírio. Trata-se de otimizar o uso da terra, produzir mais produtos, mais bens, no mesmo espaço, de forma simultânea.  

Desafios da pesquisa em silvicultura

O sistema precisa ser refinado e aí entram mais componentes de pesquisa, em especial para o manejo florestal.  Não basta simplesmente plantar as árvores: qual o desenho que será realizado? Qual espaçamento entre árvores e entre linhas? Quantas linhas de árvores? Em qual período é necessário dar mais atenção a cada componente? A premissa básica para delinear o sistema é a conservação da água e do solo, por isso não existe receita de bolo e cada caso deve ser avaliado com suas particularidades.  Abrir mais espaço para um dos componentes pode acabar prejudicando outros. Um número maior de árvores, por exemplo, pode prejudicar a pastagem em termos de recursos hídricos. Já contemplar somente a parte de grãos pode resultar em um investimento fraco no manejo florestal, o qual não vai apresentar os efeitos desejados de sombreamento e mesmo lucro posterior. É um processo de otimização dos recursos: luz, água, solo, nutrientes, microclima, entre animais e vegetais, atendendo as necessidades de cada componente.

A adoção da ILPF também auxilia na mitigação dos gases de efeito estufa, um dos compromissos brasileiros diante das mudanças climáticas. O País conta hoje com o Plano Agricultura de Baixo Carbono (Plano ABC), associado ao Programa ABC, que é uma linha de crédito para produtores rurais adotarem tecnologias mitigadoras, como é o caso do sistema silvipastoril (veja matéria na página 28). "O Plano ABC tem realizado capacitações de extensionistas em todo o País para que possam auxiliar os produtores rurais na adoção de tecnologias mitigadoras do efeito estufa. A ILPF é uma delas. Além dos benefícios da integração em si, a ILPF incentiva o planejamento de uso da terra, e isso é fundamental atualmente para uma agricultura sustentável", afirma Renato Vianna, da Emater/Seab Paraná e representante estadual do Programa ABC.

A pesquisa florestal também trabalha para entender a relação entre árvore e sequestro de carbono, para que haja um balanço benéfico entre sequestro de carbono, conforto animal e produção de madeira. "Ninguém vai investir em algo que não tenha retorno. Claro que hoje as pessoas descobriram que lucro não vem só do produto direto, mas do indireto, como, por exemplo, a imagem do negócio", pondera Porfírio. "Se nós tivermos uma pecuária e uma agricultura que demonstrem ser poupadoras de carbono, o produto disso vai ser muito mais desejado pelo mercado, em especial o internacional", acredita.

Existe ainda um grande potencial para adoção da ILPF do ponto de vista florestal. Se o País hoje apresenta um enorme passivo de pastagens degradadas e uma grande parte do consumo de madeira ainda vem de florestas nativas, os sistemas que envolvem floresta passam a ser uma grande oportunidade de negócio e de consolidação de uma imagem positiva no setor. "Propriedades rurais que têm sustentabilidade hoje trabalham com componentes de curto, médio e longo prazos, e neste último caso a produção florestal se encaixa perfeitamente. A produção de madeira de qualidade é o que o mercado necessita e a ILPF trabalha dentro dessa perspectiva", afirma Amauri Ferreira Pinto, gerente estadual de produção florestal do Instituto Emater (PR), ressaltando que o plantio de espécies florestais com fins econômicos é hoje um dos maiores componentes de renda e sustentabilidade ambiental nas propriedades rurais além de proporcionar alta taxa de retorno.

A diversificação promove maior segurança econômica ao produtor. Um caso emblemático aconteceu na região noroeste do Paraná, em um período em que a pecuária passou por grandes problemas. "Se não fossem as árvores do sistema silvipastoril, o produtor teria saído da pecuária. As árvores pagaram as contas durante um tempo, e o produtor se manteve na pecuária. Senão, ele teria que ter vendido as matrizes, parte do rebanho, o que poderia ter acabado com o negócio dele", recorda Porfírio. Por isso, a ILPF é considerada um sistema resiliente: quando um dos componentes não vai bem, o outro pode compensar. 

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Katia Pichelli
Embrapa Florestas

Mais informações sobre o tema
Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC)
www.embrapa.br/fale-conosco/sac/

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